TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

560 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 3 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos números anteriores.» O tribunal a quo considerou que a expressão “uma situação particularmente grave” era «um conceito francamente vago e que se presta razoavelmente a múltiplas interpretações. Os destinatários desta norma estavam sujeitos a dúvidas razoáveis sobre o que será “uma situação particularmente grave”, nomeadamente porque o legislador não concretizou tal conceito e o único exemplo que poderia servir para enquadrar “uma situação particularmente grave” é o que consta dessa norma: “os acidentes mortais”». Considerou, por isso, tratar-se de «uma fórmula legal demasiado vaga na descrição do tipo legal de infração, o que equivaleria a uma norma em branco, que não salvaguardava os princípios da segurança e confiança jurídicas, e que com- prometida os princípios da legalidade e da tipicidade» (cfr. ponto 1.5. da sentença, fls. 360-361). 7. O Ministério Público, no seu recurso, enuncia a norma como aquela que determina que «o emprega- dor deve comunicar à Autoridade para as Condições do Trabalho os acidentes que “evidenciem uma situação particularmente grave, nas vinte e quatro horas a seguir à ocorrência”», decorrente da interpretação do «artigo 111.º, n. os 1 e 3, da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, na redação original» (cfr. requerimento de interpo- sição de recurso, fls. 375, verso). No entanto, a norma desaplicada não corresponde exatamente ao dever de comunicação, mas antes à cominação da sua violação com uma contraordenação grave, constante do artigo 111.º, n.º 3, da Lei n.º 102/2009, também citado no recurso. A norma objeto de fiscalização é, assim, aquela que determina que constitui contraordenação grave a violação do dever do empregador comunicar à Autoridade para as Condições do Trabalho os acidentes que “evidenciem uma situação particularmente grave, nas vinte e quatro horas a seguir à ocorrência”, decorrente da interpretação do artigo 111.º, n. os 1 e 3, da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, na redação original. Não releva, para este efeito, que o legislador entretanto tenha alterado o preceito em causa através da Lei n.º 3/2014, de 28 de janeiro, fazendo recair o dever de notificação sobre «os acidentes mortais, bem como [sobre] aqueles que evidenciem lesão física grave». b) Do mérito 8. Sobre esta mesma questão o Tribunal Constitucional já teve oportunidade de emitir o Acórdão n.º 76/16, pela 3.ª Secção. Este Acórdão julgou inconstitucional a norma que impunha «ao empregador o deve de comunicar à Autoridade para as Condições do Trabalho, nas 24 horas seguintes à ocorrência, “os aci- dentes mortais ou que evidenciem uma situação particularmente grave”», que era «extraída do n.º 1 do artigo 257.º da Regulamentação do Código do Trabalho aprovada pela referida Lei n.º 35/2004», sendo que «pelo n.º 2 do artigo 482.º do mesmo diploma, a violação desse dever constitui uma contraordenação grave, que é punida nos termos do n.º 2 do artigo 620.º do Código do Trabalho então vigente» (ponto 8 do Acórdão). Neste aresto, entendeu o Tribunal (ponto 8 do Acórdão n.º 76/16) que: «A decisão recorrida recusou aplicar ao caso dos autos o referido preceito, por considerar que contém uma descrição “demasiado vaga” da conduta, insuficiente para permitir uma determinação minimamente aceitável de uma infração de mera ordenação social, constituída que é por conceitos indeterminados que não permitem ao empregador saber se deve ou não comunicar o acidente de trabalho. E de facto, se a fórmula «acidentes mortais» constitui um enunciado facilmente determinável em sede interpre- tativa, já que é possível fixar objetivamente o conceito de «morte» com recurso à experiência comum, o mesmo não ocorre com a expressão «evidenciem uma situação particularmente grave», que é insuscetível como tal de exprimir com suficiente determinação os acidentes de trabalho que devem ser comunicados às autoridades fiscalizadoras das condições de segurança no trabalho. Realmente, a expressão reveste-se de um elevado grau de indeterminação no seu conteúdo normativo. Para além da significação semântica da expressão, o sentido nela pressuposto não pode ser objetivamente determinável em toda a sua extensão. Sabe-se que nem todos os acidentes de trabalho devem

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