TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
531 acórdão n.º 819/17 b) do n.º 5 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, na redação dada pela Lei n.º 108/97, de 16 de setembro, na medida em que aí se estabeleceu um regime de constituição de enfiteuse por usuca- pião, o qual, conjugado com o regime de consolidação dos domínios útil e direto decorrente da abolição da figura, opera a translação da propriedade plena para o titular do domínio útil, o enfiteuta, sem atribuição, em termos gerais, de indemnização ao titular do domínio direto, o senhorio. Constituirá, pois, ponto fulcral na economia argumentativa do presente recurso a recuperação de largos trechos da fundamentação do Acórdão n.º 786/14. Com efeito, neste aresto, depois de se proceder à cara- terização do regime da enfiteuse no Código Civil de 1966 (ao tempo da sua abolição), referiu-se o seguinte: “[…] 6.2. Após a Revolução de 25 de Abril de 1974, o legislador nacional entendeu pôr termo à relação jurídica da enfiteuse. Surgiu então o Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, que operou a abolição da enfiteuse sobre prédios rústicos. Decorre expressamente do preâmbulo deste diploma a ratio legis que lhe está subjacente: [está transcrito no item 2.2.1. supra ] Com este objetivo, o artigo 1.º do referido Decreto-lei n.º 195-A/76, de 16 de março, determinou o seguinte: [o preceito foi transcrito no item 2.2.1. supra ] Deste modo, aí se estabeleceu o princípio da concentração da propriedade plena na titularidade única do foreiro ou enfiteuta, pondo-se termo ao desmembramento do domínio de determinado prédio rústico entre dois titulares: o titular do domínio direto (senhorio) e o titular do domínio útil (foreiro ou enfiteuta). Extinta a posi- cional dominial, o foreiro ou enfiteuta ficou investido ope legis , de forma automática, na titularidade do direito de propriedade plena sobre o prédio rústico, a partir da data de entrada em vigor do diploma. Em contrapartida, e por força de tal esquema aquisitivo, passou a incindir sobre o Estado a obrigação de indemnizar o titular do domínio direto, mas apenas quanto a um universo subjetivo restrito: quem, sendo pessoa singular, dispusesse de baixos rendimentos. Tal matéria foi regulada pelo artigo 2.º do diploma: [está transcrito no item 2.2.1. supra ] O Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 546/76, de 10 de julho, que, dando uma nova redação ao n.º 3 do artigo 1.º daquele Decreto-Lei, veio estabelecer a gratuitidade das operações de registo a que, oficiosamente, a extinção da enfiteuse dava lugar. Mais significativas foram as alterações introduzidas no diploma pelas Leis n. os 22/87, de 24 de junho, e 108/97, de 16 de setembro, ambas subordinadas à epígrafe ‘[s]obre extinção de enfiteuse ou aforamento’. […] O significado e alcance desta medida legislativa suscitou por parte da doutrina entendimentos divergentes, como dá notícia a decisão recorrida. Com efeito, face às alterações resultantes das Leis n. os 22/87, de 24 de junho, e 108/97, de 16 de setembro, António Menezes Cordeiro sustentou que fora introduzida uma ‘modalidade específica de usucapião’ (‘Da enfi- teuse: extinção e sobrevivência’, in Revista ‘O Direito’ , Ano 140.º, 2008, II, pp. 313 a 315). Segundo o referido Autor, atendendo às alterações ao Decreto-Lei n.º 195-A/76 introduzidas pela Lei n.º 108/97, o ‘interessado em afirmar-se enfiteuta’ podia em alternativa: (i) ‘invocar a usucapião nos termos normais’ ou (ii) provar os ‘indícios’ da ‘modalidade específica de usucapião’, correspondente aos factos previstos nas duas alíneas do n.º 5 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 108/97, os quais, uma vez reunidos, dispen- savam os requisitos normais da usucapião, constituindo, de facto, ‘uma concretização, ex lege, dessa figura’ (ob. cit, p. 313). Aponta-se às intervenções legislativas de 1987 e 1997 o propósito sucessivamente acentuado de facilitar da aquisição do direito enfitêutico, fazendo funcionar a usucapião ‘para além do que resultaria do seu regime normal’, porque sem qualquer inversão do título de posse e de animus emphytheutae ( ob. cit. , p. 314).
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