TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
524 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a “enfiteuse iniciada com posse em termos de arrendamento”, “equiparação à enfiteuse do arrendamento de longa duração” – é, portanto, duplamente inconstitucional [:] cria novas figuras desapropriadas sem assento constitucional [;] legitima atos ablatórios da propriedade sem qualquer previsão do regime de indemnização (CRP, artigo 62.º/2)”. Paralelamente, a mesma decisão invoca que o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 786/14, decidiu “[…] julgar inconstitucionais as normas constantes das alíneas a) e b) do n.º 5 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, na redação dada pela Lei n.º 108/97, de 16 de setembro, na medida em que aí se estabelece um regime de constituição de enfiteuse por usucapião, o qual, conjugado com o regime de consolidação dos domínios útil e direto decorrente da abolição da figura, opera a translação da propriedade plena, sem atribuição, em termos gerais, de indemnização” – ou seja, acentuando, no essen- cial, dois grandes eixos de produção de efeitos normativos em que faz assentar o juízo de inconstitucionali- dade: o da constituição da enfiteuse por usucapião; e o da ausência de indemnização ao titular do domínio direto. É este o preciso sentido dos fundamentos do juízo de inconstitucionalidade afirmado pelo STJ, que ora cumpre (re)apreciar, sendo certo que o recurso, como antes referimos, também foi interposto pelo recorrente com esse fundamento, sendo efetivamente admitido (admitido tão-somente) nesses termos, não apresen- tando aqui qualquer relevância que o Ministério Público não tenha, face à decisão de recusa, avançado com o recurso obrigatório referido no n.º 3 do artigo 72.º da LTC. 2.2. É por esta via – através da caracterização de uma decisão de recusa de normas com fundamento em inconstitucionalidade – que chegamos à apreciação do recurso e alcançamos o tema deste. Há que ter pre- sente, assim, o bloco normativo abrangido por essa recusa, correspondendo este ao objeto temático colocado à apreciação do Tribunal Constitucional. Encaremos, pois, antes de mais, o conteúdo desse conjunto de normas, inseridas no seu contexto sequencial, sublinhando estarem em causa, diretamente, os trechos dos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, já acima referidos. 2.2.1. Este Diploma – o Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março –, que, em 1976, procedeu à aboli- ção da enfiteuse, dispunha, na sua redação original, o seguinte (incluindo na transcrição que se segue o texto do preâmbulo): «Através da forma jurídica da enfiteuse têm continuado a impender sobre muitas dezenas de milhares de pequenos agricultores encargos e obrigações que correspondem a puras sequelas institucionais do modo de pro- dução feudal. Com efeito, encontram-se ainda hoje extremamente generalizados os foros, podendo referir-se que só o Estado, segundo estimativas feitas pela Direção-Geral da Fazenda Pública, é titular de domínios diretos que atingem cerca de 400000, ultrapassando o seu valor 1 milhão de contos. Uma política agrária orientada para o apoio e a libertação dos pequenos agricultores não pode deixar de inte- grar a liquidação radical de tais relações subsistentes no campo. Previu-se, no entanto, a particularidade de situação dos pequenos senhorios, tendo-se adotado uma solução que permitirá ao Estado identificar rapidamente tais situações. Nestes termos: Usando da faculdade conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea 3), da Lei Constitucional 6/75, de 26 de março, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte: Artigo 1.º 1 – É abolida a enfiteuse a que se acham sujeitos os prédios rústicos, transferindo-se o domínio direto deles para o titular do domínio útil. 2 – Nos contratos de subenfiteuse de pretérito a propriedade plena radica-se no subenfiteuta. 3 – Serão oficiosamente efetuadas as correspondentes operações de registo.
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