TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

505 acórdão n.º 812/17 29.º, n.º 1, da CRP não se aplica no caso concreto» (cfr. o Acórdão n.º 635/11, ponto 6). Em consonância, não há lugar à aplicação imediata ou subsidiária nem do Direito Penal nem do Direito Processual Penal, não se situando a norma sindicada dentro do âmbito de aplicação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. À mesma conclusão seria de chegar no presente caso, em que se está apenas perante juízos de censura. Tal como recentemente assinalado no Acórdão n.º 373/15 (ponto 1 da fundamentação), «importa ter em atenção que o conteúdo das garantias processuais é diferenciado, consoante o domínio do direito punitivo em que se situe a sua aplicação. Com efeito, como tem sido reiteradamente entendido pelo Tribunal Cons- titucional, no âmbito contraordenacional, atendendo à diferente natureza do ilícito de mera ordenação e à sua menor ressonância ética, em comparação com o ilícito criminal, é menor o peso do regime garantístico, pelo que as garantias constitucionais previstas para os ilícitos de natureza criminal não são necessariamente aplicáveis aos ilícitos contraordenacionais ou a outros ilícitos no âmbito de direito sancionatório (cfr., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n. os 158/92, 50/99, 33/02, 659/06, 99/09 e 135/09)» (juízo rea- firmado recentemente no Acórdão n.º 127/16, ponto 11). iii) Direito ao recurso fora de matéria penal 16. A tese, sustentada pelo recorrente, da incompatibilidade (ou excessiva restrição) entre a solução nor- mativa em causa e o princípio das garantias de defesa na vertente de direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, não encontra, assim, acolhimento na jurisprudência do Tribunal Constitucional. Neste âmbito, o parâmetro constitucional convocável é antes a garantia de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva consagrada no artigo 20.º da Constituição. O artigo 20.º da Constituição, sob a epígrafe «acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva», garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (n.º 1), impondo ainda que esse direito se efetive através de um processo equitativo (n.º 4). A jurisprudência do Tribunal Cons- titucional tem entendido que o direito de acesso aos tribunais implica a garantia de uma proteção jurisdi- cional eficaz ou de uma tutela judicial efetiva, cujo âmbito normativo abrange, nomeadamente:  (a) o direito de ação, no sentido do direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional;  (b)  o direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão fun- damentada;  (c)  o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa;  (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas (veja-se, neste sentido, entre outros, o Acórdão n.º 440/94, ponto III 4.). Apesar de a garantia prevista no artigo 20.º se traduzir, prima facie , no direito de acesso a um tribunal para obter uma decisão sobre a pretensão perante o mesmo deduzida, aí se inclui também a proteção contra os próprios atos jurisdicionais. Isto é, o direito de ação incorpora no seu âmbito o próprio direito de defesa contra atos jurisdicionais, o qual, obviamente, só pode ser exercido mediante o recurso para (outros) tribu- nais. Nas palavras do Tribunal Constitucional, «o direito (subjetivo) de recorrer visa assegurar aos particu- lares a possibilidade de impugnarem atos jurisdicionais e ainda tornar mais provável, em relação às matérias com maior dignidade, a emissão da decisão justa, dada a existência de mais do que uma instância» (vide o Acórdão n.º 287/90, ponto 16, recentemente referido no Acórdão n.º 652/17, ponto 2.3.). 17. Desta proposição não decorre, todavia, a existência de um ilimitado direito de recurso, extensivo a todas as matérias. Como o Tribunal Constitucional tem afirmado, com exceção da matéria penal abrangida pelo artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, tal direito não é um direito absoluto e irrestringível. O que resulta, inequivocamente, das disposições conjugadas dos artigos 20.º e 210.º da Constituição é que existe um direito geral de recurso dos atos jurisdicionais, cujo preciso conteúdo pode ser traçado, pelo legislador ordinário,

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