TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
504 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A identificação expressa no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição do direito ao recurso como garantia de defesa, resultante da revisão constitucional de 1997, não tendo implicado novidade relativamente ao entendimento que vinha já sendo feito pelo Tribunal Constitucional da sua redação anterior (cfr., entre outros, Acórdãos n. os 8/87 [n.º 6], 31/87 [n.º 5 e 7], 178/88 [n.º 5], 259/88 [n.º 2.2], 401/91 [n.º II.1 a 3], 132/92 [n.º 7], 322/93 [n.º 6]), não deixou, contudo, de representar o reconhecimento explícito da autonomia conferida a uma tal garantia no contexto geral das garantias de defesa, isto é, um valor de garantia não amortizável pelo reconhecimento de outras garantias processuais, designadamente para defesa do arguido. ‘Tal explicitação constitucional tem por efeito a garantia (constitucional) da possibilidade de interposição de recurso de decisões que respeitem a direitos, liberdades e garantias, maxime que restrinjam tais direitos’ (Acórdão n.º 686/04 [n.º 6]).» De facto, o direito ao recurso não está constitucionalmente tutelado da mesma forma nos restantes processos judiciais. Enquanto a garantia do direito ao recurso em processo penal, por força desse preceito constitucional, se apresenta como “absoluta e irrestringível”, no que respeita a outras jurisdições, os artigos 20.º e 202.º da Constituição impõem apenas um genérico direito de recurso dos atos jurisdicionais, cujo preciso conteúdo pode ser traçado, pelo legislador ordinário, com maior ou menor amplitude, estando-lhe apenas vedado abolir o sistema de recursos in toto ou afetá-lo substancialmente. Conforme se sintetizou na fundamentação do Acórdão n.º 313/07: «A introdução do n.º 10 no artigo 32.º da CRP, efetuada pela revisão constitucional de 1989, quanto aos processos de contraordenação, e alargada, pela revisão de 1997, a quaisquer processos sancionatórios, ao visar assegurar os direitos de defesa e de audiência do arguido nos processos sancionatórios não penais, os quais, na versão originária da Constituição, apenas estavam expressamente assegurados aos arguidos em processos discipli- nares no âmbito da função pública (artigo 270.º, n.º 3, correspondente ao atual artigo 269.º, n.º 3), denunciou o pensamento constitucional que os direitos consagrados para o processo penal não tinham uma aplicação direta aos demais processos sancionatórios, nomeadamente ao processo de contraordenação. Assim, o direito ao recurso atualmente consagrado no n.º 1 do artigo 32.º da C.R.P. (introduzido pela revisão de 1997), enquanto meio de defesa contra a prolação de decisões jurisdicionais injustas, assegurando-se ao arguido a possibilidade de as impugnar para um segundo grau de jurisdição, não tem aplicação direta ao processo de con- traordenação. Conforme se sustentou no Acórdão n.º 659/06, deste Tribunal, cuja fundamentação acompanhamos de perto, nos direitos constitucionais à audiência e à defesa, especialmente previstos para o processo de contraordenação e outros processos sancionatórios, no n.º 10 do artigo 32.º da C.R.P., não se pode incluir o direito a um duplo grau de apreciação jurisdicional. Esta norma exige apenas que o arguido nesses processos não-penais seja previamente ouvido e possa defender-se das imputações que lhe sejam feitas, apresentando meios de prova, requerendo a reali- zação de diligências com vista ao apuramento da verdade dos factos e alegando as suas razões. A não inclusão do direito ao recurso no âmbito mais vasto do direito de defesa constante do n.º 10 do artigo 32.º da CRP ressalta da diferença de redação dos n. os 1 e 10, deste artigo, sendo que ambas foram alteradas pela revisão de 1997, e dos trabalhos preparatórios desta revisão, em que a proposta no sentido de assegurar ao arguido ‘nos processos disciplinares e demais processos sancionatórios… todas as garantias do processo criminal’, constante do artigo 32.º-B do Projeto de Revisão Constitucional n.º 4/VII, do PCP, foi rejeitada (leia-se o debate sobre esta matéria no DAR , II Série – RC, n.º 20, de 12 de setembro, de 1996, pág. 541-544, e I Série, n.º 95, de 17 de julho de 1997, pág. 3412 a 3466).» 15. Pronunciando-se em concreto relativamente a um caso, exclusivamente, respeitante à efetivação de responsabilidade financeira reintegratória, o Tribunal Constitucional teve já oportunidade, inclusivamente, de qualificar a responsabilidade financeira como um «tipo autónomo de responsabilidade sancionatória – a financeira – o que significa que, direta e imediatamente, o princípio da legalidade penal constante do artigo
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