TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
50 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Deste modo, embora não se excluísse a possibilidade de, em certas situações, se dispensar a intermedia- ção do sistema municipal e permitir a ligação direta do utilizador final ou produtor ao sistema multimunici- pal [no entendimento de Vital Moreira/Fernanda Paula Oliveira, “Concessão de Sistemas Multimunicipais e Municipais de Abastecimento de Água, de Recolha de Efluentes e de Resíduos Sólidos”, in Vital Moreira (org.), Estudos de Regulação Pública, I, Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p. 49, tal seria admissível no caso de «utilizadores do tipo de grandes indústrias ou grandes explorações agroindustriais (por exemplo, no domínio da suinicultura) e não meros munícipes»], estipulava-se que, em primeira linha, os utilizadores deste último seriam os municípios e não os munícipes. Já os sistemas municipais funcionariam em “baixa”, ou seja, distribuindo água diretamente aos munícipes e recolhendo efluentes e resíduos sólidos no interior do município. Ligar-se-iam, a montante e a jusante destas atividades, aos sistemas multimunicipais, nos casos em que estes tivessem sido criados. A caracterização dos sistemas multimunicipais como sistemas em “alta” foi depois confirmada pelos diplo- mas que consagraram o regime jurídico da concessão da exploração e gestão dos sistemas multimunicipais, res- petivamente, de tratamento de resíduos sólidos urbanos (Decreto-Lei n.º 294/94, de 16 de novembro), capta- ção, tratamento e abastecimento de água para consumo público (Decreto-Lei n.º 319/94, de 24 de dezembro), e, finalmente, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes (Decreto-Lei n.º 162/96, de 4 de setembro). (Neste sentido, cfr. Vital Moreira/Fernanda Paula Oliveira, ob. cit. , pp. 17 e seguintes, e 38 e seguintes). É ainda de realçar que, por força do disposto no artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 379/93, a ligação aos sistemas, quer multimunicipais, quer municipais, era obrigatória para os seus utilizadores. Só assim não seria se a não obrigatoriedade fosse justificada por «razões ponderosas de interesse público», «reconhecidas por despacho do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, no caso de sistemas multimunicipais, ou por deliberação da câmara municipal respetiva, no caso de sistemas municipais» (cfr. o artigo 2.º, n.º 3). 11.4. Ao abrigo do regime estabelecido pela Lei n.º 46/77, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 372/93, e pelo diploma que a revogou e substituiu, a Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, e em coerência com o disposto no Decreto-Lei n.º 379/93, foram sendo criados, através de decreto-lei, uma multiplicidade de sistemas multimunicipais (desde logo, como vimos, pelo próprio Decreto-Lei n.º 379/93, que criou cinco sistemas). Por outro lado, a exploração e gestão destes sistemas multimunicipais foi sendo atribuída, em regime de concessão, a sociedades comerciais constituídas para o efeito através de decreto-lei, participadas pelo Estado, que detinha sempre a maioria do capital social, e bem assim pelos municípios das zonas geo- gráficas em causa. 11.5. Em 2013, tem lugar um outro ponto de viragem ou de reforma dos setores da água e saneamento. O seu primeiro momento encontra-se na aprovação da Lei n.º 35/2013, de 11 de julho, que procedeu a alteração da Lei de Delimitação de Setores (Lei n.º 88-A/97, de 25 de julho, que substituíra a Lei n.º 46/77). De acordo com o disposto na nova redação do artigo 1.º, n.º 2, da Lei n.º 88-A/97, a criação de siste- mas multimunicipais passou a estar sujeita ao requisito da necessidade de uma «intervenção do Estado em função de razões de interesse nacional» e não, como na redação anterior, de «um investimento predominante a efetuar pelo Estado, em função de razões de interesse nacional». Por outro lado, passou a distinguir-se o regime aplicável, no caso de sistemas multimunicipais, às ativida- des de recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos do respeitante às atividades de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas. As primeiras passaram a poder ser concedidas a «empresas cujo capital social seja maioritária ou integralmente subscrito por entidades do setor privado» (cfr. o artigo 1.º, n.º 5). Quanto às segundas, manteve-se a regra da subscrição maioritária do capital social por entidades do setor público (cfr. o artigo 1.º, n.º 3), mas veio- -se permitir, mediante autorização do concedente, a subconcessão a empresas participadas, maioritária ou integralmente, por entidades do setor privado (cfr. o artigo 1.º, n.º 6).
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