TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
462 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL contraordenação), antes serve como mera admoestação, como especial advertência ou reprimenda relacionada com a observância de certas proibições ou imposições legislativas; e o que esta circunstância representa em termos de medida concreta da sanção é da mais evidente importância. Deste ponto de vista se pode afirmar que as finalidades da coima são em larga medida estranhas a sentidos positivos de prevenção especial ou de (re)socialização» ( Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, págs. 144-152). Assim se compreende também que o n.º 1 do artigo 18.º do Regime Geral das Contraordenações, e a correspon- dente norma do n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, aplicável às contraordenações ambientais, defina como critérios da determinação da medida da coima, não apenas a gravidade da contraordenação, a culpa e a situação económica do agente, mas também o «benefício que este retirou da prática da contraordenação», o que permite elevar o limite máximo da coima, como prevê o n.º 2 daquele artigo, ao montante do benefício que o agente retirou da infração (ainda que este não possa exceder um terço do limite máximo legalmente estabelecido). Assim se vê que a perda do benefício económico resultante do ato ilícito é um critério fundamental da deter- minação da medida da coima, pelo qual se pretende impedir que o infrator possa ter um incentivo para repetir a conduta ilícita, inserindo-se nos fins da prevenção especial negativa. Como escreve Paulo Pinto Albuquerque ( ob. cit. , págs. 84-85), «a coima não tem um fim retributivo da culpa ética do agente, pois não visa o castigo de uma personalidade deformada refletida no facto ilícito, nem tem um fim de prevenção especial positiva, pois não visa a ressocialização de uma personalidade deformada do agente» e tem antes um «fim de prevenção especial negativa, isto é, visa evitar que o agente repita a conduta infratora, bem como um fim de prevenção geral negativa, ou seja, visa evitar que os demais agentes tomem o comportamento infrator como modelo de conduta».’ Em suma, decorre de todas as considerações precedentes que o legislador ordinário, na área do direito de mera ordena- ção social, goza de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis, devendo o Tribunal Constitucional emitir juízos de censura somente nos casos em que as soluções legislativas cominem sanções que sejam manifesta e clara- mente desproporcionais relativamente à gravidade dos comportamentos sancionados. No caso em apreço, estando-se perante uma contraordenação ambiental muito grave e outra grave, assim classifi- cadas em função da especial relevância dos direitos e interesses violados, a fixação de um limite mínimo de € 200 000 (duzentos mil euros) – e, no caso de tentativa, de € 100 000 (cem mil euros) – e de um limite mínimo de € 30 000 (trinta mil euros), como preveem as citadas normas constantes respetivamente da alínea b) do n.º 4 e da alínea b) do n.º 3 do artigo 22.º da LQCOA, para contraordenações muito graves e graves cometidas por pessoas coletivas, não pode considerar-se como manifestamente desproporcionada e afigura-se antes ser suficiente para prevenir e evitar eventuais danos para o ambiente e ainda possuir o necessário efeito dissuasor para evitar a repetição da conduta infratora e impedir que a norma violada fique desprovida da sua eficácia jurídica. Aliás, ainda no que toca à alegada desproporcionalidade dos valores das coimas estabelecidos para as contraor- denações ambientais, tal como é mencionado pelo próprio Ministério Público, não podemos deixar de lembrar que o legislador até já procedeu a uma considerável redução dos valores das coimas aplicáveis. Com efeito, nos termos do artigo 22.º, n.º 4, alínea b) , na redação original da Lei n.º 50/2006, no caso das contraordenações ambientais muito graves, o limite mínimo da coima aplicável era de € 500 000 (quinhentos mil euros), ao passo que hoje, nos termos da Lei n.º 89/2009, passou a ser de € 200 000 (duzentos mil euros). Por sua vez, no caso das contraordenações graves, o limite mínimo da coima aplicável era de € 42 000 euros (quarenta e dois mil euros), enquanto hoje, à luz da Lei n.º 89/2009, passou a ser de € 30 000 (trinta mil euros). […] Por fim, refira-se que a jurisprudência que a recorrente invoca a propósito da coima aplicável pela não apre- sentação do livro de reclamações não constitui lugar paralelo ao ora em apreço. Isto porque aquela situação é bem menos gravosa que a do presente caso – naquela estava em causa a aplicação de uma coima pela recusa reiterada de apresentação do livro de reclamações, ao passo que no caso dos autos está em causa a aplicação de coimas no âmbito de contraordenações ambientais, em que podem ser provocados danos, muitas vezes irreversíveis ou incalculáveis, ao meio ambiente. Acrescente-se que, embora o Tribunal da Relação de Guimarães tenha desaplicado a norma em causa, por entender que a mesma era inconstitucional, o Plenário do Tribunal Constitucional, dirimindo divergência
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