TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
461 acórdão n.º 772/17 Esta argumentação é inteiramente transponível para o caso em apreciação, em que estão em causa as correspon- dentes normas constantes da alínea b) do n.º 4 do e da alínea b) do n.º 3 do artigo 22.º da LQCOA, que definem o montante das coimas para as contraordenações muito graves e graves, quando se trate de infrações praticadas por pessoas coletivas. Em relação ao facto de decorrerem dos referidos preceitos normas que elevam consideravelmente a coima mínima aplicável a pessoas coletivas, relativamente ao limite mínimo estabelecido para o mesmo tipo de infração e o mesmo grau de culpa, quando cometido por pessoas singulares, é de notar que a distinção encontra a sua razão de ser no próprio princípio da igualdade. Com efeito, conforme se afirmou no Acórdão n.º 569/98 (…), não é possível estabelecer, à luz do disposto no artigo 12.º da CRP, um princípio de equiparação ou presunção de igualdade entre personalidade singular e personalidade cole- tiva. Pelo contrário, como se escreveu no Acórdão n.º 110/12: ‘(…) o legislador pode instituir tratamento diferenciado em relação a pessoas coletivas com base justamente na específica natureza e características dessas entidades no confronto com as pessoas físicas que detenham personalidade individual. Essa fundamental distinção explica que se tenha assistido no âmbito do direito san- cionatório, e em especial no domínio do direito de mera ordenação social, a uma progressiva responsabilização das pessoas coletivas, que se tem caracterizado também pelo estabelecimento de coimas de montantes mais ele- vados do que os determinados para as pessoas singulares em relação ao mesmo tipo de infração. Nesse sentido, o agravamento da moldura abstrata das coimas aplicáveis às pessoas coletivas foi consagrado como princípio geral no Regime Geral das Contraordenações, como ressalta do seu artigo 17.º, que prevê como montante máximo da coima € 44 891,81 ou € 22 445,91, em caso de negligência, por contraponto aos limites de € 3 740,98 e € 1 870,49, para as pessoas singulares (cfr. Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contraordenações, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2011, págs. 76-77). A norma em questão insere-se, por conseguinte, na lógica do sistema e na tradição legislativa adotada em sede de punição de contraordenações, com diferenciação dos limites aplicáveis, consoante se esteja perante pessoas coletivas ou singulares. E como também se assinala no citado acórdão n.º 569/98, essa diferenciação justifica-se pela inexistência de uma igualdade fáctica entre os agentes do ilícito contraordenacional quando se trate de pessoas coletivas e pessoas singulares, e também se explica, numa perspetiva de prevenção geral dos comportamentos ilícitos, pela necessidade de evitar a diluição da responsabilidade individual quando a infração seja imputável a uma entidade com personalidade coletiva.’ Quanto ao argumento aduzido pela recorrente de que o legislador teria desconsiderado, ‘relativamente às contraorde- nações ambientais, as enormes diferenças quanto à ofensividade e necessidade de tutela existentes entre o direito penal e o direito de mera ordenação social’, em face das diferenças existentes entre as duas realidades, não é possível aferir da propor- cionalidade da medida da coima tomando por termo de referência a medida das penas criminais de natureza pecuniária. Nesse sentido, é completamente transponível para o presente caso as considerações feitas no Acórdão n.º 110/12: “Em primeiro lugar há que ter em consideração que as diferenças existentes entre a ilicitude de natureza cri- minal e o ilícito de mera ordenação social obstam a que se proceda a uma simples transposição, sem mais, dos princípios constitucionais aplicáveis em matéria de definição de penas criminais para o espaço sancionatório do ilícito de mera ordenação social. Como se sublinha no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 336/08, citando Figueiredo Dias, existem, desde sempre, razões de ordem substancial que impõem a distinção entre crimes e contraordenações, entre as quais avulta a natureza do ilícito e da sanção, sendo que a diferente natureza do ilícito condiciona, desde logo, a eventual inci- dência dos princípios da culpa, da proporcionalidade e da sociabilidade. E por isso, se o direito das contraordenações não deixa de ser um direito sancionatório de caráter punitivo, a verdade é que a sua sanção típica «se diferencia, na sua essência e nas suas finalidades, da pena criminal, mesmo da pena de multa criminal (…) A coima não se liga, ao contrário da pena criminal, à personalidade do agente e à sua atitude interna (consequência da diferente natureza e da diferente função da culpa na responsabilidade pela
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