TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

445 acórdão n.º 752/17 4. Assim delimitado o objeto do presente recurso, profere-se decisão sumária ex vi artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, pelo facto de a questão a decidir ser simples, em virtude de a mesma se apresentar como manifestamente infundada. 5. Com efeito, de nenhum parâmetro constitucional – nem dos que são mobilizados pela recorrente nem de qualquer outro – decorre a regra (ou, sequer, o princípio) de que em sede cautelar não podem ser apreciadas ques- tões próprias (ou igualmente pertencentes) ao processo principal, designadamente quando as mesmas relevam a propósito da subsistência do próprio processo cautelar. Perante o tribunal recorrido, a recorrente fez assentar a alegada inconstitucionalidade da interpretação do artigo 123.º, n.º 1, alínea a) , do CPTA, em três ordens de razões: em primeiro lugar, no facto de que, seguindo uma «ordem natural das coisas, a questão da tempestividade do pedido de condenação à prática do ato devido [deveria ser] apre- ciada em sede própria, isto é, no âmbito do processo principal»; em segundo lugar, e assim não sendo, corre-se o risco de coexistirem «duas decisões totalmente opostas sobre uma mesma questão jurídica»; e, por fim, «porque é o julga- dor do processo principal quem melhor do que ninguém pode aceder a todos os dados necessários a essa decisão, na medida em que o processo cautelar é feito de alegações perfuntórias e provas sumárias» (fls. 420 verso). Assim sintetizada a argumentação da recorrente, intui-se desde logo a manifesta falta de fundamento da ques- tão de constitucionalidade suscitada. Com efeito, de nenhum dos eixos argumentativos supra enunciados decorre, sequer remotamente, a demonstração de uma violação de norma ou princípio constitucional, designadamente os que foram invocados pela recorrente. A própria recorrente, aliás, não cura de esclarecer tal aspeto. 6. Desde logo, a argumentação cotejada a propósito de uma melhor ordenação processual baseada numa sepa- ração estanque entre o processo cautelar e o processo principal, a proceder, relevaria de outro plano que não o da apreciação da conformidade constitucional normativa. Com efeito, de nenhum dos parâmetros cotejados decorre a imposição constitucional negativa de, em sede cautelar, apreciar o mérito de questão atinente ao processo principal cuja apreciação se projete, também, no âmbito da procedência do processo cautelar, designadamente a tempesti- vidade da propositura da ação referente a este último. O mesmo se diga quanto à alegada falta de idoneidade do juiz cautelar para proceder a tal apreciação. Por fim, a alegada coexistência, na ordem jurídica, de duas decisões antagónicas, embora teoricamente condenável, sob o prisma constitucional, à luz das exigências de segurança decorrentes, desde logo, do princípio do Estado de direito democrático, afirmado no artigo 2.º da Constituição, não colhe: como salientou a decisão recorrida, «não se vê qualquer razão para estabelecer um regime jurídico diferente e impor, contra a letra da lei, que no caso de ter sido interposta a ação principal se declare primeiro no processo principal a caducidade. É que a declaração de caducidade da decisão cautelar, neste caso provisória, tem uma natureza e uma finalidade distintas e autónomas da declaração de caducidade do direito de ação» (fls. 470). Acresce que as exigências de segurança jurídica devem coadunar-se com outros valores igualmente relevantes no plano constitucional, tal como o que se reporta à celeridade processual e a equidade do processo cautelar. Assim, desaparecendo alguns dos indícios que justificaram a viabilidade provisória da pretensão cautelar, ou surgindo outros que contrariem o mesmo juízo provisório, importa que a situação possa ser desde logo reapreciada, tendo em vista impedir o prolongamento de um estado de coisas que já não corresponde à situação inicial e em vista da qual a providência foi decretada. Daí também a previsão expressa da possibilidade de alteração ou de revogação, inclusive por iniciativa do tribunal, das providências já decretadas (cfr. o artigo 124.º, n.º 1, do CPTA). Além disso, nada impede a apresentação de nova pretensão cautelar na pendência do processo principal adequada às novas circunstâncias nem o novo decretamento provisório de uma providência [cfr. os artigos 114.º, n.º 1, alínea c) , e 131.º, n.º 2, ambos do citado Código]. Finalmente, a propositura atempada do meio principal é um requisito do próprio processo cautelar: impedir que o juiz deste último ficasse impedido de apreciar esse aspeto é que poderia suscitar os problemas invocados pela própria recorrente.  7. Dos parâmetros constitucionais que vêm cotejados pela recorrente resulta, sinteticamente, o seguinte qua- dro de conformação: Em primeiro lugar, o artigo 20.º da Constituição garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (n.º 1), impondo ainda que esse direito se efetive através de um processo

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