TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
444 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 5. A Decisão Sumária n.º 489/17 tem a seguinte fundamentação: «3. Importa, em primeiro lugar, proceder à clarificação do objeto do presente recurso. Com efeito, na resposta ao convite para completar o seu requerimento de recurso, a recorrente identificou duas questões distintas: em pri- meiro lugar, a interpretação do artigo 123.º, n.º 1, alínea a) , do CPTA, «segundo a qual cabe ao julgador do pro- cesso cautelar decretar a caducidade das providências com fundamento na intempestividade do pedido deduzido na ação principal sem que o julgador da ação principal, entretanto intentada, tenha ainda tomado qualquer decisão sobre tal questão»; e, em segundo lugar, a interpretação do artigo 69.º, n. os 2 e 3, do CPTA, «no sentido de que a apreciação da tempestividade do pedido deduzido na ação principal pode ser primeiramente apreciada no processo cautelar para aferição da caducidade da providência e eventual extinção do processo». Contudo, embora sejam duas as questões pretendidas sindicar, o objeto do presente recurso terá de ser objeto de delimitação. 3.1. O recurso de constitucionalidade tem um caráter instrumental em relação à decisão recorrida, pelo que a sua admissibilidade depende da existência do interesse processual em ver revogada a decisão proferida, ou seja, “é ainda indispensável que a eventual procedência do recurso seja útil” (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Legitimidade e Interesse no Recurso de Fiscalização Concreta da Constitucionalidade, versão de 2015, acessível [ online ] […] [O] objeto (material) do recurso de constitucionalidade deve coincidir com a ratio decidendi da decisão recor- rida (que constitui o seu objeto formal). Atenta a aludida função instrumental dos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade face ao processo-base, exige-se, para que o recurso tenha efeito útil, que haja ocorrido efetiva aplicação pela decisão recorrida da norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade é sindicada [cfr. o artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC]. É necessário, pois, que esse critério normativo tenha constituído ratio decidendi do acórdão recorrido, pois, só assim, um eventual juízo de inconstitucionalidade poderá determinar uma reformulação dessa decisão. A utilidade do recurso de constitucionalidade encontra-se liminarmente afastada quando, designadamente, o critério normativo sindicado não coincide com o que foi aplicado pelo tribunal a quo. Como se salientou no Acórdão n.º 351/16 (acessível, como os demais adiante citados, a partir de http://www. tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ) , para que se considere aberta a via de recurso para o Tribunal Constitucional, «necessário é que a pronúncia do Tribunal que vier a ocorrer, se bem que circunscrita à questão de constitucio- nalidade (artigo 280.º, n.º 6, da CRP), possa produzir efeitos sobre a decisão recorrida, que será confirmada ou mandada reformar (artigo 80.º da LTC) de acordo com o juízo proferido no recurso quanto à validade da “norma” que constituiu o seu objeto». E, em consonância, o Tribunal Constitucional tem os seus poderes de cognição em fiscalização concreta da constitucionalidade limitados à norma que a decisão recorrida, conforme os casos, tenha aplicado ou a que haja recusado aplicação (cfr. o artigo 79.º-C da LTC). 3.2. No presente caso, importa determinar a ratio decidendi da decisão recorrida, de modo a comprovar a procedência, quanto ao objeto impugnatório concretizado pela recorrente, do requisito atinente à utilidade da pronúncia em sede de recurso de constitucionalidade. Impugnando embora a recorrente duas dimensões normativas distintas, atinentes aos artigos 123.º, n.º 1, alínea a) , e 69.º, n. os 2 e 3, ambos do CPTA, constata-se que tais normas não foram aplicadas, em simultâneo, como fundamento pela decisão recorrida, nos sentidos especificados por aquele sujeito processual. Com efeito, este fundamento – isto é, a aludida ratio – reside apenas na interpretação do artigo 123.º, n.º 1, alínea a) , do CPTA, segundo a qual cabe ao julgador do processo cautelar decretar a caducidade das providências com fundamento na intempestividade do pedido deduzido na ação principal sem que o julgador da ação principal, entretanto inten- tada, tenha ainda tomado qualquer decisão sobre a questão. Analisada a decisão recorrida, nada nela se encontra quanto à relevância atribuída ao artigo 69.º, n. os 2, e 3, do CPTA, nomeadamente com o sentido interpretativo sindicado pela recorrente. Na verdade, este último sentido não é imputado pelo tribunal a quo ao artigo 69.º, n. os 2 e 3 do CPTA, mas antes – e apenas – ao artigo 123.º, n.º 1, alínea a) , do CPTA. A relevância da disciplina convocada pelos n. os 2 e 3 do artigo 69.º do CPTA reflete-se tão-só na parte atinente ao cômputo do prazo aplicável, in casu , para que se pudesse aferir da tempestividade da propositura da ação principal, sendo o mesmo desprovido de qualquer outro significado normativo, designada- mente no que se reporta à dimensão normativa que a recorrente pretende ver apreciada nos presentes autos.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=