TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

433 acórdão n.º 750/17 a liquidação do imposto foi efetuada contra legem , sendo imposto pelo legislador o estabelecimento de uma relação direta entre os encargos financeiros incorridos e a aquisição de partes de capital, circunscrevendo desse modo a esfera de indedutibilidade dos encargos financeiros incorridos por SGPS, tal como decorre da formulação adotada pela recorrente. Não obstante, tem razão a recorrida quando refere que a decisão arbitral não aplicou critério normativo que exija, a par de uma afetação direta, a presença de uma relação de afetação específica entre encargos finan- ceiros e aquisição de partes de capital. A exigência de “afetação direta ou específica” consta, na verdade, do ponto 7 da Circular n.º 7/2004, e para a mesma remete igualmente a declaração de voto aposta no acórdão recorrido, veiculando entendimento que o tribunal a quo expressamente afastou. Por essa razão, o advérbio “especificadamente” deve ser expurgado da interpretação normativa a conhecer. Conclui-se, assim, que, delimitada nos termos afirmados, estão reunidos os pressupostos de que depende o conhecimento da primeira questão de constitucionalidade, com referência a interpretação normativa, extraída do n.º 2 do artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, no sentido de que a exclusão da dedução dos encargos financeiros para determinação do lucro tributável das SGPS se circunscreve aos suportados com obtenção de financiamento diretamente relacionados com a aquisição de partes de capital. 6.5. No que concerne à admissibilidade da segunda questão formulada, em resposta à advertência que lhe foi dirigida pelo Relator, defende a recorrente que o tribunal a quo sustenta que “basta ao sujeito passivo evocar a ilegalidade da Circular n.º 7/2004”, argumentando com os fundamentos de facto da decisão recor- rida e o acolhimento do entendimento de que “o ónus probatório […], não se encontra acometido ao sujeito passivo, mas à AT”, para concluir que a decisão arbitral aplicou, como razão de decidir, a interpretação nor- mativa cuja constitucionalidade questionou por último. Diferentemente, a recorrida defendeu que o sentido normativo questionado não foi aplicado pelo tribunal a quo na decisão do litígio em presença. E, de facto, assim acontece, sendo patente a falência da argumentação esgrimida pela recorrente em prol da utilidade do conhecimento da questão que formulou, desde logo face à expressa rejeição de uma tal interpretação, como avulta do seguinte trecho da decisão recorrida: «No que concerne à alegada inconstitucionalidade do artigo 32.º, n.º 2, do EBF, por violação do princípio da capacidade contributiva, enunciado no artigo 104.º da CRP, quando interpretado no sentido de que, sendo inapli- cável a Circular n.º 7/2004, todos e quaisquer encargos financeiros suportados com financiamentos relacionados com aquisições de participações sociais são dedutíveis, independentemente de prova promovida por aquele sujeito passivo para o efeito, nem se percebe a pertinência da sua colocação no caso em apreço, pois a interpretação aqui adotada é precisamente a contrária: o artigo 32.º, n.º 2, do EBF permite à SGPS provar que os encargos financeiro que suportou não estão relacionados com a aquisição de participações sociais e são esses que são dedutíveis; a interpretação daquela norma adotada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, com base na Circular n.º 7/2004, ao impedir essa prova, se fosse a prevista na lei, é que poderia gerar dificuldade da sua compatibilização [com] aquele princípio constitucional, além de outros.»            Por outro lado, a questão de inconstitucionalidade colocada não versa sentido normativo relativo à repartição do ónus de prova e ao respetivo cumprimento, nem se vê como reportar esse problema apenas à estipulação contida no artigo 32.º, n.º 2, do EBF. Acresce que a decisão recorrida se absteve de apreciar tal dimensão problemática, com fundamento em que não fora apreciada na decisão da reclamação graciosa (cfr. pp. 30 e 31 da decisão), o que, aliás, motivou a declaração de voto aposta no aresto recorrido, sublinhando justamente que “importa[va] analisar o cumprimento do ónus de prova”. Por último, ao contrário do defendido, não se vê como possa o que se dá como provado nas alíneas A) a C) dos fundamentos de facto, que se reconduz apenas à descrição do comportamento declarativo e impug- natório do sujeito tributário – desprovida de qualquer valoração jurídica, como é timbre do juízo de facto –, consubstanciar a aplicação de critério normativo com o sentido apontado pela recorrente.

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