TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

430 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL capital, é no mínimo inqualificável, e deve ser tido em conta por este Tribunal de recurso atento o princípio da boa fé e da proibição de venire contra factum proprium . II. Pontos 3 a 6 do requerimento de interposição de recurso K) Mais uma vez não existe a decisão contra a qual a AT se insurge, agora nos pontos 3 a 6 do requerimento de interposição de recurso. L) Efetivamente, ao contrário do que se ficciona no recurso de inconstitucionalidade da AT, a decisão arbitral não decidiu que “a exclusão da dedução dos encargos financeiros se circunscreve aos apurados específica e diretamente relacionados com a aquisição de partes de capital” (ponto 43 das alegações da AT). M) Com efeito, em primeiro lugar, jamais a decisão arbitral usa a expressão [direta] “e específica”. Essa é antes a expressão usada pela Circular n.º 712004, ponto 7, recuperada na declaração de voto de vencido de Manuel Pires. N) Em segundo lugar, a decisão arbitral, o que decidiu, não foi que “a exclusão da dedução dos encargos finan- ceiros se circunscreve aos apurados específica e diretamente relacionados com a aquisição de partes de capital” (ponto 43 das alegações da A T). O) Antes decidiu que (i) em face do que prescreve a lei fiscal em análise (artigo 32.º, n.º 2, do EBF) “uma conclusão no sentido da indedutibilidade dos encargos financeiros referidos pela Requerente na reclamação graciosa só poderia ser alcançada pela Autoridade Tributária e Aduaneira na sequência da apreciação da prova apresentada pela ora Requerente, relativa à forma como foram adquiridas as participações sociais que indi- cou” (pág. 27 da decisão arbitral) e que (ii) a AT não podia invocar como autoridade contra esta interpretação da lei a Circular n.º 7/2004 porquanto “[o] ponto 7 da Circular n.º 7/2004 consubstancia uma norma de natureza inovadora sobre a determinação da matéria tributável de IRC, criando situações de indedutibilidade de encargos financeiros não previstas na lei (aquelas em que não haja relação entre encargos desse tipo e a aquisição de participações sociais), pelo que é inválida por violação do princípio da legalidade” (pág. 28 da decisão arbitral). P) Ou seja, muito mais modestamente do que aquilo que lhe imputa a AT no seu recurso de inconstitucionali- dade, a decisão arbitral limitou-se a entender que o artigo 32.º, n.º 2, do EBF, não autorizava a AT a ignorar a prova apresentada pelo contribuinte com respeito à matéria dos encargos financeiros imputáveis ou não imputáveis à aquisição de partes de capital, e que a invocação pela AT da Circular n.º 7/2004 em nada muda os dados do problema por não se poder sobrepor a construção administrativa de uma fórmula ao que diz a lei, e lei sobre matéria da reserva da competência parlamentar. Q) Em qualquer caso (mas sem prescindir) a afetação direta não origina um tratamento desigual das holdings puras nem poderia originar, pela razão simples de que se aplica indistintamente, sem distinções, às holdings puras e mistas, e ninguém disse o contrário, muito menos a decisão arbitral recorrida (cfr. em especial as suas págs. 28 e 29). R) Se, como parece querer dizer a AT, as holdings puras tiverem menos probabilidade de suportar encargos financeiros não relacionados com a aquisição de partes de capital, isso nenhuma desigualdade de tratamento por parte da lei configura: se realmente (por oposição ao resultado ficcionado por fórmula) não suporta juros senão com a aquisição de partes de capital, quanto mais não seja por nenhuma outra despesa porventura ter, então a totalidade dos eventuais encargos financeiros serão indedutíveis, em resultado da sua demonstrada (por oposição a ficcionada/presumida) relação com ativo beneficiário de certo regime fiscal, revelada através da averiguação da afetação direta ou real. S) Se, pelo contrário, a holding pura tiver outras despesas, designadamente com pessoal encarregue de estar a par do que se passa nas participadas (para um exercício informado do direito de voto e de todos os outros direitos acionistas), com serviços externos de contabilidade e revisão de contas, com serviços externos jurídi- cos e de consultoria para efeitos de compra ou vendas de participações sociais (ou para efeitos de exercício de direitos acionistas), então pode dar-se o caso, tal como com uma holding mista, que, no todo ou em parte,

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