TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

394 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No Acórdão n.º 376/16, o Tribunal Constitucional não julgou inconstitucional «a norma extraída do artigo 84.º, n. os 4 e 5, da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, segundo a qual a impugnação interposta de decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coimas tem, em regra, efeito devolutivo, apenas lhe podendo ser atribuído efeito suspensivo quando a execução da decisão cause ao visado prejuízo considerável e este preste caução, em sua substituição, no prazo fixado pelo tribunal», tendo excluído expressamente do objeto do recurso a dimensão normativa atinente à impossibilidade de graduação do valor da caução e à circunstân- cia de a prestação de caução operar sem que esteja acautelada a potencial situação de insuficiência de bens económicos do arguido. O citado Acórdão fundamentou a sua decisão no entendimento de que a solução consagrada na lei em relação à regra do efeito devolutivo do recurso, apesar de restringir o direito à tutela efetiva e à presunção de inocência, ainda respeita o princípio da proporcionalidade, dada a relevância dos interesses públicos em causa e o diferente alcance do princípio da presunção de inocência no processo contraordenacional e no processo penal: «Considerando a natureza de «interesse público ou coletivo» dos bens jurídicos que o Direito da Concorrência pretende salvaguardar, com relevo constitucional e no quadro da UE [artigos 81.º, alínea f ) , 99.º, n.º 1, alíneas a) e c) , da Constituição, e artigos 3.º, n.º 3 do TFUE, não se afigura injustificado ou desrazoável a adoção, como regra geral, do efeito devolutivo da impugnação interposta das decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coimas. É uma medida normativa que garante maior eficácia às decisões sancionatórias, dissuadindo comporta- mentos processuais que, por infundados e dilatórios, comprometem a defesa efetiva desses valores (cfr., a propó- sito, Lopes do Rego, «Aspetos constitucionais da política da concorrência em Portugal», em Revista do Ministério Público , Ano 29, janeiro-março 2008, número 113, págs. 8-9). Por outro lado, importa sublinhar que a Autoridade da Concorrência, enquanto entidade administrativa a quem compete a prossecução do interesse público de prevenção e repressão da violação desses bens jurídicos, está subordinada, no exercício das suas funções, por expressa previsão constitucional, aos princípios fundamentais que regem toda Administração Pública, assumindo particular relevo, no domínio sancionatório, a sujeição aos prin- cípios da legalidade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade (artigo 266.º, n.º 2, da Constituição). Está em causa a aplicação de sanções (coimas), cujos critérios de determinação estão legalmente previstos (artigo 69.º da Lei da Concorrência), pela prática de infrações tipificadas por lei (artigo 68.º), e após a instauração de um processo administrativo cujos termos legais genericamente asseguram ao arguido o seu direito de audiência e defesa (cfr. artigos 7.º, n. os 1 e 2, 25.º, 26.º, 33.º, n.º 1, e 59.º do mesmo diploma legal). (…) Finalmente, admitindo-se que o princípio da presunção de inocência não é uma conquista privativa do pro- cesso criminal, devendo estruturar todos os processos que possam culminar com a aplicação de sanções discipli- nares ou contraordenacionais, com implicações diretas ao nível do ónus da prova e do princípio in dubio pro reo , não se afigura que ele possa valer para as decisões administrativas de aplicação de coimas com o mesmo sentido e alcance com que vale, por força do n.º 2 do artigo 32.º da Constituição, para as sentenças judiciais de condenação proferidas em processo criminal». Por sua vez, o Acórdão n.º 674/16 julgou inconstitucional «a norma que estabelece que a impugnação judicial de decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coima tem, em regra, efeito devolutivo, apenas lhe podendo ser atribuído efeito suspensivo quando a execução da decisão cause ao visado prejuízo considerável e este preste caução, em sua substituição, no prazo fixado pelo tribunal, independentemente da sua disponibilidade económica, interpretativamente extraível dos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio». E fê-lo, por entender que a interpretação normativa extraída do artigo 84.º, n. os 4 e 5, da Lei da Con- corrência, violava o princípio da proporcionalidade nas suas dimensões da necessidade e da justa medida:

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