TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

392 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL que consagra o regime da impugnação judicial das contraordenações aplicadas, conferindo ao Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão plena jurisdição das decisões em que tenha sido fixada pela ERS uma coima ou uma sanção acessória, podendo reduzir ou aumentar a coima ou alterar a sanção acessória (n.º 3) e atribuindo ao recurso efeito meramente devolutivo, nos termos do n.º 5 do citado preceito. Nestes preceitos, mostra-se inscrito um regime particular contraordenacional em matéria de saúde, o qual, além da definição das contraordenações, prevê ainda sanções acessórias, o modo de determinação do quantum das coimas, o regime de prescrição das mesmas, a publicidade das sanções e, finalmente, o controlo pelo Tribunal competente do modo de aplicação de tais contraordenações. Ainda com relevo para a natureza destas sanções, determina expressamente a alínea b) , do artigo 24.º do diploma em análise que os procedimentos sancionatórios respeitam o princípio da audiência e defesa dos infratores, o princípio do contraditório e demais princípios constantes da lei, designadamente do regime geral do ilícito de mera ordenação social. Trata-se, portanto, de uma remissão para o Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, que consagrou o regime geral das contraordenações e coimas. A norma consagrada no artigo 67.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 126/2014 não tem paralelo na legislação que a antecedeu. O Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de dezembro estipulava, no seu artigo 49.º, n.º 1, que «Das decisões proferidas pela ERS que determinem a aplicação de coimas ou de outras sanções previstas cabe recurso para os tribunais judiciais, nos termos da lei», e, no seu n.º 2, «Das demais decisões, despachos ou outras medidas adoptadas pela ERS cabe recurso para os tribunais judiciais, com efeito meramente devolu- tivo, nos termos e limites fixados no n.º 2 do artigo 55.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro». O Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, que veio substituir o de 2003, não fixava o efeito do recurso para os tribunais, limitando-se a consagrar no artigo 58.º, n.º 2, que as decisões de aplicação de coimas ou sanções são judicialmente impugnáveis, nos termos da lei. 7. O regime jurídico posto em crise estabelece a regra do efeito meramente devolutivo da impugnação judicial da decisão da ERS que aplique uma coima ou outra sanção, em processo contraordenacional, admi- tindo o efeito suspensivo, apenas mediante o duplo requisito de alegação e prova da existência de um prejuízo considerável e da prestação de caução em substituição da coima em que o impugnante foi condenado. Este regime jurídico representa um desvio à regra consagrada no regime geral das contraordenações que é, por remissão para o Código de Processo Penal (CPP), o do efeito suspensivo da impugnação [artigo 408.º, n.º 1, alínea a) , do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 2, do RGCOC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro]. Idêntica regra vigora em relação aos recursos interpostos das decisões que aplicam coimas e outras san- ções proferidas, em processo contraordenacional, pela Autoridade da Concorrência (artigo 84.º, n. os 4 e 5, da Lei da Concorrência) e pelo Banco de Portugal, entidade independente com poderes de supervisão e san- cionatórios, no âmbito do setor bancário e do Sistema Europeu de Bancos Centrais [cfr. em especial, artigos 102.º da CRP, 127.º, 129.º e 130.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), 1.º, 3.º, n.º 3 e 7.º do Protocolo relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC) e do Banco Central Europeu (BCE) e 17.º dos Estatutos do Banco de Portugal (BP)]. Também na impugnação judicial interposta das decisões administrativas de aplicação de coimas no domínio das contraordenações laborais e de segurança social apenas é admitido o efeito suspensivo mediante a prestação de garantia artigo 35.º, n.º 1, da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro), o que também ocorre em matéria de infrações tributárias, ainda que neste caso a garantia seja dispensada quando o interessado demonstre a insuficiência de meios económi- cos [artigo 84.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT)]. O legislador, na modelação do regime de impugnação das decisões sancionatórias proferidas por tais entidades administrativas, ponderou a necessidade de conferir maior eficácia aos respetivos poderes san- cionatórios, de modo a garantir, no plano substantivo, uma maior proteção aos valores e bens tutelados nos específicos domínios normativos em que atuam. Atribuindo, em regra, efeito devolutivo ao recurso, e

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=