TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
387 acórdão n.º 728/17 com a apontada questão de inconstitucionalidade, nem através dele pode de algum modo ver-se presumido o cometimento da infração. 14.ª Como se observa no Acórdão do STA, de 15 de Maio de 2013, Proc. 665/13, no caso paralelo da norma contida no art. 84.º do RGIT – havendo, relativamente a esse, uma diferença de grau no que respeita à possibili- dade da prestação de garantia para evitar a executoriedade da decisão de aplicação de coima pela ERS –, «a presta- ção de garantia emerge como um ónus para o recorrente que pretenda obter o efeito suspensivo do recurso, que leva a questão da eventual desconformidade do preceito a transferir-se para um juízo sobre a avaliação da adequação de tal ónus, à luz das exigências do princípio da proporcionalidade, tendo em conta o interesse público que presidiu à adoção de tal solução». 15.ª É, pois, no quadro do direito à tutela jurisdicional efetiva, nele convocado o princípio da proporciona- lidade (arts. 20.º, n.º 5 e 18.º, n.º 2 da Constituição) – tal como primeiramente afirmado na decisão recorrida –, bem como da garantia de impugnação dos atos administrativos sancionatórios perante os tribunais (art. 268.º, n.º 4 da Constituição), que a presente questão de constitucionalidade haverá de ser dirimida. 16.ª Importa na matéria ter-se presente que, nos termos do n.º 3 do art. 67.º dos Estatutos da ERS, o Tribu- nal «conhece com plena jurisdição dos recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada pela ERS uma coima ou uma sanção acessória, podendo reduzir ou aumentar a coima ou alterar a sanção acessória». 17.ª Sendo que a abertura da impugnação judicial não se conforma, no caso, a um recurso de mera legalidade ou de cassação, mas de plena jurisdição, deve assinalar-se, em contraponto, e à luz da jurisprudência constitucional, a ampla margem de modelação do regime por parte do legislador ordinário. 18.ª Pontuadas as limitações à liberdade de conformação do regime de impugnação judicial de decisões admi- nistrativas sancionatórias, por parte do legislador ordinário, não pode constitucionalmente validar-se a tese, expressa na decisão recorrida, de que «a decisão impugnada, por via da impugnação judicial, adquira um valor meramente enunciativo» e de que, a essa luz e como «corolário irrenunciável» do regime de plena jurisdição, «valendo apenas como imputação fática e legal, tal como está consagrado no art.º 62.º, n.º 1, do RGCO.». 19.ª O regime impugnatório estabelecido nas normas emcausa não deve ser unidimensionado comomedida cau- telar ou antecipatória, antes como resultado, por parte do legislador, «de uma perspetiva global que tenha [teve] em conta a multiplicidade de interesses em causa, alguns deles conflituantes entre si». 20.ª O regime contido no n.º 5 do art. 67.º dos Estatutos da ERS, em verdadeira alternativa à imediata exigên- cia de pagamento, faculta ao visado a não efetiva ablação do seu património, mediante a prestação de uma garantia de boa cobrança futura. 21.ª Tal faculdade é concedida ao visado sempre que a «execução da decisão lhe cause prejuízo considerá- vel» (n.º 5 do art. 67.º, cit.). 22.ª Inexiste impedimento, mas balizada restrição, ao exercício do direito de impugnação por parte do visado: pretendendo este, com a impugnação, a destruição da imediata executoriedade do ato – vingando entre nós um sistema de administração executiva, com o reconhecimento da primazia do interesse público sobre o interesse privado –, fica condicionado à verificação de determinado requisito (causar-lhe a execução da decisão prejuízo considerável) e ao cumprimento de um ónus (prestação de caução). 23.ª Tal conformação do regime da impugnação adequada e justificadamente radica na natureza e atribuições cometidas à ERS, enquanto entidade administrativa independente constitucionalmente legitimada (art. 267.º, n.º 3 da Constituição), em vista das incumbências prioritárias do Estado de garantir o acesso de todos os cidadãos aos cuidados de saúde (art. 64.º, n.º 3 da Constituição) e, no sector, a transparência e concorrência do mercado, com proteção dos utentes [Constituição, arts. 81.º, alíneas f ) e i) e 99.º, alíneas a) e e) ]. 24.ª Tem por missão o exercício de funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concor- rência respeitantes às atividades económicas na área da saúde dos setores privado, público, cooperativo e social, competindo-lhe, no que respeita à supervisão dos estabelecimentos prestadores dos cuidados de saúde, garantir o cumprimento dos requisitos de exercício da atividade e de funcionamento dos mesmos, a realização dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de cuidados de saúde de qualidade, bem como dos demais
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