TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

386 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 3.ª O DL 126/2014, de 22 de agosto, diploma sem alterações até à data, procede a repetida reestruturação da ERS, à luz do regime estabelecido na lei-quadro das entidades reguladoras, que fora aprovada em anexo à Lei 67/2013, de 28 de agosto, revogando o DL 127/2009, de 27 de Maio e aprovando os novos Estatutos (respetiva- mente, arts. 6.º e 2.º).  4.ª A atribuição, como regra, de efeito meramente devolutivo ao recurso de decisões sancionatórias proferidas pela ERS em processos contraordenacionais vai ao arrepio do regime geral nos domínios contraordenacional e penal, mas encontra paralelismo no regime de recursos das decisões de outras entidades administrativas inde- pendentes e, na administração direta do Estado, de recursos das sentenças, em matéria de coimas aplicadas pela Administração Tributária e Aduaneira.  5.ª É sobre o novo regime do recurso, tal como passou a constar do n.º 5 do art. 67.º dos Estatutos da ERS, que incide o juízo de inconstitucionalidade expresso na decisão recorrida.  6.ª Tal juízo assenta em dois distintos fundamentos, ambos igualmente dimensionados à luz do princípio da proporcionalidade (art. 18.º, n.º 2 da Constituição): (i)  violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, por des- proporcionada restrição do mesmo – arts. 20.º, n.º 5 e 18.º, n.º 2 da Constituição e (ii)  violação do princípio de presunção de inocência – art. 32.º, n.º 2 da Constituição.  7.ª A declaração de inconstitucionalidade contida na decisão recorrida convoca cumulativamente os arts. 2.º (Estado de direito democrático), 16.º (âmbito e sentido dos direitos fundamentais) e 17.º (regime dos direitos, liberdades e garantias) da Constituição – a operada convocação, contudo, na economia da decisão recorrida, conforma-se como mero corolário das proposições anteriormente estabelecidas, quanto à violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, por desproporcionada restrição do mesmo e à violação do princípio de presunção de inocência.   8.ª No que respeita à declarada violação do princípio de presunção de inocência, a decisão recorrida expres- samente toma  «como referência de análise o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 198/90», embora admi- tindo «que neste aresto estava em causa uma situação diferente e mais flagrante do que a solução normativa em análise».  9.ª «Constitui afirmação recorrente na jurisprudência do Tribunal Constitucional a da não aplicabilidade direta e global aos processos contra ordenacionais dos princípios constitucionais próprios do processo criminal», com- pletada tal afirmação com «a necessidade de serem observados determinados princípios comuns que o legislador contra ordenacional será chamado a concretizar dentro de um poder de conformação mais aberto do que aquele que lhe caberá em matéria de processo penal».  10.ª Sufragada na jurisprudência constitucional a aplicação do princípio da presunção de inocência do arguido, no seu núcleo essencial, a demais procedimentos sancionatórios, desde logo no domínio disciplinar, como no caso do Ac. 198/90, referenciado na decisão recorrida, mas também, no que ora diretamente releva, no domínio contraordenacional.  11.ª O referenciado Ac. 198/90, para declarar «inconstitucional a norma do artigo 37.º do Regulamento Disciplinar aprovado pelo Decreto de 22 de fevereiro de 1913, aplicável ao pessoal da Caixa Geral de Depósitos, na parte em que permite a perda total do vencimento do funcionário “desligado do serviço” por contra ele haver sido instaurado processo disciplinar», entendeu que tal regime «além de se traduzir na antecipação de um quadro de efeitos semelhantes aos da pena disciplinar de demissão, revela-se também afrontador do princípio da propor- cionalidade postulado pelo princípio do Estado de direito democrático, dada a manifesta desconformidade entre a medida cautelar imposta e o fim que através dela se pretendia atingir».  12.ª Situação diferente – e sem paralelismo com a dos autos.  13.ª Sabendo-se, embora, que «não é fácil determinar o sentido da presunção de inocência do arguido» e tendo-se o mesmo princípio, no seu núcleo essencial, a par do direito de defesa, como aplicável ao processo con- traordenacional, também enquanto «simples irradiação para esse domínio sancionatório de requisitos constitutivos do Estado de direito democrático», não se dimensionando o específico regime de recurso em causa, nos termos estabelecidos no n.º 5 do art. 67.º dos Estatutos da ERS, como medida cautelar ou antecipatória, não se confronta

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