TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

366 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL D. O Tribunal Arbitral concluiu que as aludidas exceções deveriam improceder, sustentando que, de acordo com o teor do Acórdão n.º 410/15 do Tribunal Constitucional, «ao impedir que a impugnação do ato de liquidação do imposto se funde em vícios próprios do ato de cessação do benefício fiscal, a interpretação que a decisão recorrida fez do artigo 54.º do CPPT desprotege gravemente os direitos do contribuinte, assim ofendendo princípio da tutela judicial efetiva e princípio da justiça, inscritos nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP, julgando inconstitucional tal interpretação o artigo 54.º do CPPT». E. Entendeu ainda o Tribunal que a impugnação autónoma destacável da decisão de deferimento ou indeferi- mento do benefício fiscal se apresenta como «uma faculdade de impugnar e não um ónus». F. Conforme consta na salvaguarda ao artigo 54.º do CPPT, são judicialmente impugnáveis todos os atos que sejam lesivos da esfera jurídica dos contribuintes, pelo que são impugnáveis os atos que visem produzir efeitos jurídicos externos nas situações individuais e concretas. G. O ato administrativo-tributário que negou a concessão do benefício fiscal de residente não habitual ao Recor- rido não se apresenta como um ato preparatório do ato de liquidação em sede de IRS para 2010, mas apresenta-se antes como um ato que lhe é pressuposto, autónomo, com efeitos próprios, e cuja impugnação contenciosa surge como um verdadeiro dever, sob pena de posterior impugnabilidade. H. Não podem ser impugnados, designadamente, aquando e a título de eventual impugnação do ato conse- quente, pois este apenas poderá ser impugnado relativamente a vícios próprios e não com base em vícios que atinjam o ato pressuposto. I. Observada a factualidade dada como assente, temos que foi observado o princípio constitucional previsto nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, ambos da CRP, segundo o qual «é garantido aos administrados tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer atos administrativos que os lesem, independente- mente da sua forma, a determinação da prática de atos administrativos legalmente devidos e a adoção de medidas cautelares adequadas.» J. Tendo existido essa oportunidade impugnatória, a que acresce o fato de, como se disse, o indeferimento de um benefício fiscal ser um ato pressuposto e autónomo face ao ato de liquidação em sede de IRS do Recorri- do, infere-se que no ato de impugnação arbitral, deduzido contra o ato tributário em sentido estrito, não mais é possível discutir matéria que se sedimentou, há muito, horizontal e definitivamente na ordem jurídica. K. A impugnação judicial da legalidade de um tal ato não pode deixar de ter por objeto o ato administrativo pressuposto, a extinção do benefício fiscal, reportando-se, por conseguinte, a essa impugnação os correspon- dentes pressupostos processuais, como seja o prazo da correspondente ação administrativa. L. Não faz sentido que se possa ficar à espera da consequente liquidação do imposto para, em sede da impugna- ção deste ato, se atacarem os efeitos que, embora decorrentes daquele ato, se repercutem inteiramente no ato de liquidação. M. Devem, por conseguinte, ser atacados autonomamente, não podendo ser posteriormente atacados, aquando da correspetiva liquidação de imposto. N. Como ato administrativo autónomo que é, a decisão que indeferiu o pedido de residência não habitual é um ato judicialmente impugnável, cuja impugnação contenciosa deve ser desencadeada no prazo de 3 meses, sendo que a impugnação ocorrerá através de uma ação administrativa dirigida contra o ato administrativo relativo ao benefício fiscal em causa e não contra o ato de liquidação do correspondente imposto. O. A decisão arbitral de quem vem interposto o recurso, ao rejeitar a aplicação do artigo 54.º, n.º 1, primeira parte do CPPT, violou os princípios da tutela judicial efetiva e da justiça, designadamente na dimensão nor- mativa tal como interpretada pelo Tribunal arbitral, designadamente por ter entendido (mal) que a impug- nação de um ato imediatamente lesivo como foi o despacho de indeferimento do pedido de benefício fiscal se apresenta como uma faculdade e não um incontornável ónus, que, omitido, coarta a impugnação da correspetiva liquidação, com os vícios próprios do ato de indeferimento.

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