TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
365 acórdão n.º 718/17 A posição sustentada pela AT tem como consequência que o Requerente que não impugnou autonomamente o ato de indeferimento de inscrição como não residente habitual em Portugal, para o ano de 2010, deixa de poder impugnar a liquidação do IRS de 2010 com fundamento em vícios daquele ato. Efetivamente, como o Tribunal Constitucional já teve oportunidade de se pronunciar, no Acórdão n.º 410/15, de 19 de novembro, “Não pode deixar de se reconhecer que se trata de uma consequência muito onerosa para o contribuinte, permitindo a consolidação na ordem jurídica de atos que o prejudicam gravemente (…) com a impossibilidade de impugnar o ato de cessação do benefício fiscal, no âmbito do processo de impugnação do ato de liquidação do imposto. Este prejuízo causado ao contribuinte ocorreu num contexto legal em que vigora inquestionavelmente o princípio da impugnação unitária e em que a impugnação autónoma de atos lesivos ou interlocutórios praticados no âmbito do procedimento administrativo tributário é configurada pela lei como uma faculdade do contribuinte, apenas justificada no quadro do reforço das suas garantias. O contribuinte poderia ter impugnado autonomamente a cessação do benefício fiscal. A sua escolha em não o fazer, porém, foi, naquele quadro legal, perfeitamente legítima: não só não se encontra qualquer norma legal que tenha operado a transformação da faculdade de impugnar em ónus de impugnar, como, tratando-se, como se tratou, de ato lesivo, nem sequer seria admissível a existência de tal norma.”. Concluindo que, “ao impedir que a impugnação do ato de liquidação do imposto se funde em vícios próprios do ato de cessação do benefício fiscal, a interpretação que a decisão recorrida fez do artigo 54.º do CPPT despro- tege gravemente os direitos do contribuinte, assim ofendendo princípio da tutela judicial efetiva e o princípio da justiça, inscritos nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP.”, julgando inconstitucional tal interpretação o artigo 54.º do CPPT. 20. Nesta cadência, não podemos acompanhar, salvo o devido respeito, a posição da Requerida, de que o Requerente ao não impugnar autonomamente o ato que determinou a sua não inscrição no regime fiscal dos resi- dentes não habituais, deixa de poder impugnar a consequente liquidação do IRS de 2010, com fundamento em vícios daquele ato. Efetivamente, o Requerente poderia ter impugnado autonomamente o ato de não inscrição como residente não habitual para efeitos fiscais, tendo em conta o inquestionável princípio da impugnação unitária, não podendo deixar-se de reconhecer que a posição da Requerida é muito onerosa para o contribuinte, permitindo a consolida- ção na ordem jurídica de atos que o prejudicam gravemente. Contudo, a sua escolha em não o fazer, é uma faculdade de impugnar e não um ónus. Assim sendo, atento os princípios da tutela judicial efetiva e da justiça, inscritos nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP, o Requerente não pode ser impedido de impugnar o ato de liquidação do IRS de 2010, com vícios pró- prios do ato da sua não inscrição como residente não habitual para efeitos fiscais». 4. Notificada para o efeito, a recorrente produziu alegações, em 20 de dezembro de 2016, de onde se extraem as seguintes conclusões: “Conclusões: A. Por acórdão arbitral de 17-08-2016, foi julgado totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral dedu- zido contra a decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão do ato tributário de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano de 2010, com o n.º 20114001613163. B. No âmbito da sua Resposta, entre o mais, tratou a ora recorrente de deduzir a exceção dilatória de incompe- tência material do Tribunal Arbitral e caducidade do direito da ação, porquanto, atendendo a que o pedido do aí Autor, ora Recorrido, recaía sobre o indeferimento do pedido da sua inscrição como residente não habitual para o ano de 2010, não podia tal matéria ser discutida em sede arbitral. C. Em sede de Resposta, pugnou a ora recorrente pelo acolhimento da tese de que o indeferimento do pedido de inscrição como residente não habitual se trata de um ato imediatamente lesivo que, nos termos do artigo 54.º do CPPT, é suscetível de impugnação autónoma, ato prévio e destacável à impugnação do ato final de liquidação.
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