TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

362 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Configurando o ato de reconhecimento do estatuto de residente não habitual um ato administrativo autónomo, com efeitos próprios e que se estendem para além do ato de liquidação do imposto que imediatamente se lhe segue, nada parece haver de anómalo, do ponto de vista da ratio subjacente a um tal regime, que a sua impugnação autónoma constitua para o contribuinte um ónus e não uma mera faculdade; se aquele ato não for judicialmente impugnado, no prazo legalmente fixado para o efeito, não mais o poderá ser, excluindo-se a possibilidade de impugnação do ato consequente – como o de liquidação do tributo –, com fundamento em vícios que atinjam aquele seu ato pressuposto. IV – Quanto ao confronto da norma sob sindicância com o princípio da tutela jurisdicional efetiva, na dimensão do direito de ação enquanto direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhe- cimento de um órgão jurisdicional, tendo por certo que os atos administrativos relativos ao reco- nhecimento do estatuto de residente não habitual consubstanciam um ato meramente pressuposto dos atos de liquidação do imposto – inscrevendo-se cada um deles no âmbito de um procedimento administrativo-tributário próprio e autónomo –, o que importa determinar é se ao contribuinte ora recorrido foi conferida efetiva possibilidade de reação contenciosa contra o ato que indeferiu o pedido de reconhecimento do estatuto de residente não habitual em Portugal – isto é, se, relativamente àquele ato, lhe foi assegurada uma tutela jurisdicional efetiva. V – Considerados os meios através dos quais o ordenamento jurídico faculta ao destinatário a possibilida- de de reagir judicialmente contra o ato de indeferimento do pedido de reconhecimento do estatuto de residente não habitual, tendo tido o contribuinte ora recorrido plena possibilidade de reagir con- tenciosamente, contra o ato de indeferimento do pedido de reconhecimento do benefício fiscal que apresentou, não se vê como a exclusão da possibilidade de invocação dos vícios deste em momento ulterior – isto é, no âmbito da impugnação da legalidade do ato de liquidação do imposto – possa violar o princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva; trata-se tão-só da impossibilidade de o contribuinte que não impugne diretamente o ato de indeferimento do pedido de reconhecimento do estatuto fiscal pretendido o poder vir a fazer ainda a posteriori , em sede de impugnação do ato de liquidação do respetivo imposto, apesar de expirado o prazo legal para a invocação do vício relativo ao primeiro ato; contendo-se tal efeito dentro dos limites a cuja imposição se encontra indissociavelmen- te ligada a função inerentemente disciplinadora de qualquer ordenamento jurídico-processual, não se vê que ocorra qualquer violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva, constante do artigo 20.º da Constituição. VI – Do mesmo modo, tendo em conta as várias possibilidades impugnatórias de que o contribuinte pode- ria ter lançado mão no caso sub judice – embora o não tenha feito –, ainda que a solução recusada pelo tribunal a quo possa não ser, de entre as abstratamente configuráveis, aquela que maior nível de proteção assegura aos particulares, não é censurável à luz do princípio da justiça, consagrado no n.º 4 do artigo 268.º da Constituição.

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