TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

312 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL De facto, na confrontação dos interesses aqui em presença – interesses do mandante e o desiderato de boa administração da justiça – distinta conclusão hermenêutica redundaria, necessariamente, num expe- diente dilatório, que atentaria contra o dever de administração célere da justiça. Note-se que, no caso parti- cular sub judice , o recebimento dos embargos preventivos impulsionados pela embargante havia já determi- nado a suspensão, até à decisão final, da ação de despejo que se encontrava em curso, sendo que, por força do disposto no artigo 15.º-S, n.º 8, da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, em tal ação, os atos a praticar pelo juiz assumem caráter urgente. Acresce que, até à data da audiência, a embargante esteve sempre representada por mandatário, o qual foi conformando a ação de acordo com a estratégia processual gizada em consonância com a embargante, sendo notificado do despacho saneador proferido (fls. 120) e bem assim dos meios de prova a produzir em julgamento (fls. 122 verso e 123), tendo estado presente na audiência prévia realizada (fls. 148), participado em anterior audiência de julgamento, na qual se determinou a suspensão da instância pelo prazo de 15 dias (fls. 182), e tendo sido notificado da impossibilidade de notificação de várias testemunhas por si indicadas no rol (fls. 221). Na data do julgamento, apenas o mandatário da embargante e as testemunhas da embargante (cuja comparência em audiência lhe cabia assegurar) se mostravam ausentes (cfr. ata de fls. 234), sendo que a audiência prosseguiu com a produção de declarações de parte e depoimentos de parte previamente admiti- dos, após o que a mandatária dos embargados prescindiu da produção da prova testemunhal que atempada- mente indicara. Após a prolação da sentença que julgou improcedente o pedido da embargante, esta constituiu novo mandatário, através do qual interpôs o competente recurso de apelação, que confirmou o decidido na pri- meira instância. Destarte, se a embargante viu gorada a sua expetativa na obtenção de desfecho distinto da ação, por via da prova por si apresentada em audiência de julgamento, tal resultado deve-se unicamente à ausência do seu mandatário, sendo certo que tal ausência não constituía causa de adiamento do julgamento (artigo 603.º, n.º 1, do CPC) e, a verdade é que, em momento processual imediatamente anterior e imediatamente poste- rior, a embargante esteve sempre representada por causídico. A norma em causa procede a uma conciliação entre os interesses do mandatário, os do mandante e ainda aos interesses da boa administração da justiça. Assim se compreende que a revogação e a renúncia do man- dato judicial tenham lugar no próprio processo e que a renúncia seja pessoalmente notificada ao mandante, com a advertência dos efeitos previstos no n.º 3 (artigo 47.º, n.º 2, do CPC). O regime do artigo 47.º do CPC visa justamente acautelar a produção de efeitos negativos para a parte, quando o patrocínio é obriga- tório e a parte não consegue imediatamente constituir novo mandatário. Daí que o advogado renunciante continue ligado ao mandato, durante 20 dias, até, dentro deste prazo – de dimensão perfeitamente razoável – o mandante constituir novo mandatário, extinguindo-se, então, o primeiro mandato.     Estando, por força da lei, o mandatário judicial constituído ligado ao mandato, no momento em que ocorreu a audiência de julgamento, não pode afirmar-se que se tenha verificado qualquer perturbação relati- vamente ao exercício do direito à tutela efetiva que afetasse a posição processual da recorrente. O facto de a audiência de julgamento ter prosseguido, sem que a embargante estivesse representada, resultou da ausência do advogado, que, segundo o tribunal recorrido, incumpriu os seus deveres deontológicos. Por outro lado, independentemente de uma eventual quebra na relação de confiança entre a mandante e o mandatário, o certo é este não poderia deixar de cumprir as obrigações a que se encontrava adstrito enquanto o mandato não pudesse considerar-se extinto. Não há, por isso, qualquer risco, em situação de normalidade e desde que se use a diligência devida, de a parte deixar de exercer os direitos processuais por virtude da renúncia do mandato, visto que a lei contempla mecanismos que permitem assegurar a representação processual sem prejuízo para a defesa dos interesses que se pretende fazer valer na ação.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=