TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

311 acórdão n.º 671/17 efeitos negativos para a parte devido à falta de constituição de advogado quando esse patrocínio é obrigatório. Daí que o advogado renunciante continue ligado ao mandato, pelo menos, até que este se extinga com a notificação prevista naquele preceito (cfr., neste sentido, Luís Vasconcelos Abreu, em anotação ao acórdão do STJ de 16 de abril de 2002, citado). Não se mostram, pois, violados quaisquer dos direitos e princípios constitucionais invocados». No referido aresto deste Tribunal Constitucional, os parâmetros constitucionais escrutinados foram, igualmente, os artigos 2.º e 20.º da Constituição, pelo que o argumentário ali aduzido consente transposição para os presentes autos e não sobreveio fundamento que justifique a inversão da orientação jurisprudencial anteriormente adotada. Em primeiro lugar, importa ter presente a factualidade em causa nos autos: a embargante constituiu mandatário e apresentou em juízo embargos de terceiros de natureza preventiva, que foram admitidos e determinaram a suspensão da ação principal de despejo a que foram apensos. Na data consensualmente designada para a realização da audiência de discussão e julgamento (1 de julho de 2015), a embargante apresentou-se desacompanhada de mandatário, que havia apresentado a renúncia ao mandato no dia 30 de junho de 2015, encontrando-se ainda em curso o prazo de 20 dias a que alude o artigo 47.º, n.º 3, do CPC. Por conseguinte, a juíza a quo determinou a realização da audiência de julgamento, dado que a renúncia apenas produzia efeitos após aquele prazo, sendo que a circunstância de o mandatário da embargante se encontrar faltoso não constituía causa de adiamento do julgamento. Argumenta a recorrente (embargante) que a interpretação acolhida nos autos posterga o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, nos casos em que em que tal patrocínio é obrigatório. Não importa saber se essa interpretação é a mais correta no plano infraconstitucional, mas sim se essa interpretação é tolerada pelas enunciadas diretrizes constitucionais. Vejamos: Os princípios do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artigo 20.º da CRP, consubstanciam uma manifestação do imperativo de constitucionalização de direitos fundamentais numa dimensão organizacional, procedimental e processual, ali se acolhendo uma pluralidade de direitos conexos com o direito geral à proteção jurídica.  O artigo 20.º da CRP é, assim, uma norma-princípio estruturante do Estado de direito democrático que reconhece vários direitos conexos, todos eles integrando um direito geral à proteção jurídica: a garantia do acesso ao direito e aos tribunais (n.º 1), que engloba o direito ao patrocínio judiciário, enquanto direito de os particulares serem técnico-juridicamente aconselhados em vista a obterem uma cabal defesa das suas posições jurídico-substantivas (n.º 2); o direito ao processo equitativo, que envolve, entre outras vertentes, a aplicação do princípio da igualdade de armas ou de igualdade substantiva das partes no processo, do princí- pio da proibição da indefesa e do princípio do contraditório (n.º 4); e o direito à tutela jurisdicional efetiva, que postula a possibilidade de recurso  a tipos de ações que assegurem a efetividade da proteção de direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (n.º 5). Ora, tal direito manteve-se incólume na interpretação acolhida e ora posta em crise, na medida em que se concluiu que a renúncia ao mandato ainda não havia produzido efeitos, pelo que caberia ao mandatário, que apenas na véspera apresentara a renúncia, assegurar a realização da audiência de discussão e julgamento em representação da embargante. Na verdade, como já antes se afirmara no Acórdão n.º 314/07, e foi reiterado no citado Acórdão n.º 188/10, da aplicação do artigo 39.º do CPC resulta que a renúncia ao mandato por parte de advogado constituído não tem como consequência a imediata extinção da relação de mandato e a consequente cessação das obrigações do mandatário para com o seu cliente, mantendo-se o dever do mandatário renunciante de prestar assistência ao mandante, o qual, de resto, tem de ser “pontual e escrupulosamente cumprido”, como impunha o artigo 83.º do Estatuto da Ordem dos Advogados e o atual artigo 88.º (Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro), que reproduz o seu teor.

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