TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
301 acórdão n.º 652/17 “[…] A única norma questionada no presente recurso é a do artigo 456.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (e anteriormente às alterações introduzidas no Código em 1995 e 1996), com relação à litigância de má fé e à res- ponsabilidade das partes nessa litigância. Norma de que se serviu o acórdão recorrido – citando-a expressamente – para a aplicar oficiosamente à situação da recorrente, condenando esta como litigante de má fé “no pagamento de quinze unidades de conta”. E, talqualmente se expressa a mesma recorrente, “sem audição prévia das partes e sem exercício do contraditório, pois a recorrente nunca foi notificada para se pronunciar sobre a possibilidade de uma decisão nesse sentido” […]. Sobre as normas dos n. os 1 e 2 daquele artigo 456.º pronunciou-se já o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 440/94, publicado no Diário da República , II Série, n.º 202, de 1 de setembro de 1994, não as julgando incons- titucionais, “na parte relativa à condenação em multa por litigância de má fé, desde que interpretadas no sentido de tal condenação estar condicionada pela prévia audição dos interessados sobre tal matéria” (alínea b) da decisão), com a seguinte e essencial fundamentação e respondendo à pergunta: ‘mas será que a não audição do interessado e a consequente eliminação do seu direito de defesa são geradoras de lesão constitucional?’: ‘Definido, assim, o conteúdo genérico do direito fundamental de acesso aos tribunais, que leva implicada a proibição da indefesa, tem-se por seguro que o regime instituído nas normas do artigo 456.º, n. os 1 e 2, do Código de Processo Civil, quando interpretadas no sentido de a condenação em multa por litigância de má fé não pressupor a prévia audição do interessado em termos de este poder alegar o que tiver por conveniente sobre uma anunciada e previsível condenação, padecerá de inconstitucionalidade, por ofensa daquele princípio constitucional. Com efeito, semelhante interpretação priva por completo o interessado de poder apresentar perante o tribunal qualquer tipo de defesa, acabando por ser confrontado com uma decisão condenatória cujos funda- mentos de facto e de direito não teve oportunidade de contraditar. Mas não resulta imperativo que tais preceitos hajam necessariamente de ser julgados inconstitucionais, já que, mostrando-se embora incompatível com a Lei Fundamental a interpretação que lhes foi dada na decisão recorrida, outra existe que os torna constitucionalmente comportáveis. Com efeito, mostra-se possível e adequada uma interpretação de conformidade constitucional daquelas normas, em termos de condicionar o juízo de condenação ali previsto à prévia notificação do litigante suspei- tado de má fé processual, concedendo-lhe um prazo para nos autos responder o que tiver por conveniente. Com este sentido e alcance, não subsiste naquelas normas qualquer vício constitucional’. O mesmo discurso argumentativo foi retomado no Acórdão n.º 103/95, publicado no Diário da República , II Série, n.º 138, de 17 de junho de 1995, ainda que a propósito de outra norma – a do artigo 458.º do mesmo Código – e nestes termos: ‘A condenação por litigância de má fé só deve, obviamente, ter lugar, dando-se à parte (ou, sendo o caso, ao seu representante), antes de assim ser condenada, a oportunidade de se defender, para o que tem que ser, previamente, ouvida. Ou seja: uma tal condenação exige que se observe, no processo, o princípio do contra- ditório, que – no dizer de Manuel de Andrade ( Noções Elementares de Processo Civil, cit., pp. 364 e 365) – está ao serviço do princípio da igualdade das partes e consiste em que ‘cada uma das partes é chamada a deduzir as suas razões (de facto e de direito), a oferecer as provas, a controlar as provas do adversário e a discretear sobre o valor e resultados de umas e de outras’. O princípio do contraditório, embora não formulado na Constituição expressamente para o processo civil, não pode, na verdade, deixar de valer também neste domínio. Ele traduz, com efeito, uma exigência própria da ideia de Estado de direito [cfr., neste sentido, Acórdãos n. os 397/89, 62/91 e 284/91 (publicados no Diário da República , II
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