TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
268 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 7-A/2016, e ao consequente aumento da coleta de Imposto do Selo devida, ou seja, de agravar desfavora- velmente o modo de calcular o quantum devido a título daquele Imposto (cfr. o n.º 7 da decisão reclamada). Não é assim. OTribunal Constitucional é o tribunal ao qual compete especificamente administrar a justiça em maté- rias de natureza jurídico-constitucional, nomeadamente exercendo a fiscalização concreta da constitucionali- dade: a apreciação da inconstitucionalidade de normas de direito infraconstitucional aplicadas ou recusadas aplicar por outros tribunais (artigos 221.º, 223.º, n.º 1, e 280.º, n.º 1, todos da Constituição). No âmbito de tal sistema de fiscalização da constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Constitucional cingese ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, de questões de desconfor- midade constitucional imputada a normas ou a interpretações normativas; não ao controlo da inconstitucio- nalidade das próprias decisões judiciais. O objeto material do recurso de constitucionalidade deve, por isso, e sob pena de inidoneidade, revestir um caráter normativo: corresponde ao critério normativo da decisão, a uma norma ancorada num ou mais preceitos jurídico-positivos, abstratamente enunciada e vocacionada para uma aplicação potencialmente genérica; não se destina a sindicar o puro ato de julgamento, enquanto ponderação casuística da singularidade própria e irrepetível do caso concreto. Por outro lado, dada a proibição de qualquer tribunal aplicar nos feitos submetidos ao seu julgamento normas que infrinjam o disposto na Constituição, compreende-se que a intervenção do Tribunal Constitu- cional ocorra em via de recurso, pressupondo uma prévia decisão sobre a questão da inconstitucionalidade por parte do tribunal recorrido: assim, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribu- nais que recusem a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade (decisões positivas de inconstitucionalidade) ou que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo (decisões negativas de inconstitucionalidade; cfr. os artigos 204.º e 280.º, n.º 1, ambos da Constituição). Em qualquer dos casos, tais recursos são restritos à questão da inconstitucionalidade (artigo 280.º, n.º 6, do mesmo normativo; cfr. também o e artigo 71.º, n.º 1, da LTC). A conformação dos poderes de cognição do Tribunal Constitucional em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade – apreciação da constitucionalidade (e, em certos casos, também da ilegalidade) de normas jurídicas aplicadas por outros tribunais, não obstante a sua constitucionalidade ter sido questionada, ou recusadas aplicar pelos mesmos, com fundamento em inconstitucionalidade (cfr. o artigo 79.º-C da LTC) – tem, desde logo, dois tipos de consequências, assim destacadas por Cardoso da Costa (“Jurisdição Cons- titucional e Jurisdição Comum (Cooperação ou Antagonismo?)” in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Joaquim Gomes Canotilho, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2012, pp. 193 e seguintes, pp. 202-203): «(…) – [A] tutela ou garantia contenciosa da conformidade constitucional – nomeadamente sob o ponto de vista do respeito pelos direitos fundamentais – de outros atos ou situações jurídicas fica exclusivamente confiada à responsabilidade dos tribunais comuns […] E será designadamente assim quanto às próprias decisões judiciais em si mesmas consideradas – é dizer, no tocante a essas decisões quando a questão da sua confor- midade com a Constituição não tenha a ver e não dependa da constitucionalidade da norma ou normas jurídicas que as suportam ou de que fazem aplicação; – [Q]uando o Tribunal Constitucional é chamado a pronunciar-se, em via de recurso, sobre certa norma […], o seu juízo vai afinal incidir, não sobre uma norma cujo sentido ele tem direta e primariamente de estabelecer, e antes, sobre a norma com o sentido e alcance que foram pré-definidos pela decisão de um outro tribunal [, pelo que] a sua apreciação e a sua decisão não têm de respeitar necessariamente à norma on its face e em toda a sua dimensão, mas bem podem (e devem) muitas vezes circunscrever-se a uma sua certa interpretação – sendo só essa interpretação (a estabelecida pelo tribunal recorrido) que o Tribunal, consoante o que sobre ela vier a entender, avalisará ou cassará».
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