TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
248 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL decorre que a solução consagrada no artigo 77.º, n.º 4, da LTC, constitui um regime excecional – um ius singulare –, cujo âmbito de aplicação se contém nos limites da disposição legal expressa, nada obstando à apreciação da questão prévia ao conhecimento do mérito do recurso. IV – Nas alegações produzidas neste Tribunal, o recorrente atribui à norma sindicada um alcance obje- tivo consideravelmente mais extenso do que o da norma que constitui o fundamento da decisão recorrida; no seu entender, a questão de constitucionalidade diz respeito ao facto de uma «pesquisa genérica» abranger todo o conteúdo do sistema informático, nomeadamente o correio eletrónico que nele se encontre armazenado, assentando tal entendimento no pressuposto de que a pesquisa permite o acesso ao conteúdo de correio eletrónico, na medida em que, sendo genérica – isto é, não dirigida a dados informáticos previamente identificados e individualizados pelo Ministério Público –, com- preende todo o conteúdo do sistema informático sobre o qual incida; ora, é um dado seguro que o acesso ao conteúdo de mensagens de correio eletrónico não integra o conceito de pesquisa de sistema informático, para efeitos de delimitação da norma aplicada na decisão recorrida e sindicada junto deste Tribunal; se é certo que uma pesquisa genérica permite identificar a eventual presença de correio eletrónico e de outros dados informáticos suscetíveis de revelar dados pessoais ou íntimos que estejam armazenados num sistema informático, é igualmente claro que a mesma não abrange o acesso ao con- teúdo ou mesmo a autorização para apreender esses elementos. V – Não foi com o sentido e alcance que lhes atribui o recorrente que os artigos 11.º, n.º 1, alínea c), e 15.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, foram interpretados e aplicados pelo tri- bunal recorrido; aí se interpretou o artigo 15.º como regulando apenas a pesquisa de um sistema infor- mático – o mesmo é dizer: a determinação do que lá se encontra armazenado –, mas não a apreensão de qualquer elemento cuja presença seja revelada pela pesquisa, nem o caso especial das mensagens de correio eletrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, as quais não foram aber- tas pelos agentes que realizaram a pesquisa, antes tendo sido preservadas em suporte informático, seladas e apresentadas ao Juiz de Instrução, que delas tomou primeiro conhecimento, decidindo então o respetivo destino, para tal invocando o disposto no artigo 17.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setem- bro, pelo que se conclui que a norma que constitui o objeto do recurso não foi a ratio decidendi da decisão recorrida. Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acór- dão daquele tribunal, de 23 de novembro de 2016. 2. O ora recorrente, na qualidade de arguido em processo-crime, interpôs recurso do acórdão proferido pelo tribunal de 1.ª instância que o condenou numa pena de nove anos de prisão pela prática de crime de
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