TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
236 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL além de valores coletivos de paz social, a segurança jurídica e a liberdade pessoal – valores protegidos pela dimensão garantística do princípio da legalidade. A este propósito, veja-se a orientação jurisprudencial desenvolvida no Acórdão n.º 205/99 e reprodu- zida, mais tarde, no Acórdão n.º 412/03: «A sujeição da prescrição às decorrências do princípio da legalidade tem sido problematizada em função da sua qualificação como instituto de Direito Penal substantivo ou adjectivo, persistindo a primeira qualificação. Mas, independentemente do tratamento das relações entre a prescrição e o princípio da legalidade num plano classi- ficatório, uma construção dogmática implantada nos fundamentos específicos da prescrição independentemente da sua natureza penal ou processual penal justifica o instituto por razões de necessidade da pena em conjugação com uma lógica de controlo do poder punitivo do Estado [cfr. Fernanda Palma, «Princípio da aplicação retroactiva da lei (penal) mais favorável e alteração de prazos prescricionais no direito de mera ordenação social», em Revista Fisco, n.º 34, 1991]. Com efeito, não é só a desnecessidade da pena que o decurso do tempo implica, quando o facto já foi assimilado ou esquecido pela sociedade, mas também uma responsabilização do Estado pela inércia ou incapacidade para realizar a aplicação do Direito no caso concreto (cfr., acerca desta dimensão de uma garantia de objectividade como inerente à legalidade e à proibição de retroactividade, Jakobs, Strafrecht, Allgemeiner Teil, 2.ª ed., p. 95 e seguintes). Na interrupção da prescrição, repercute-se aquela fundamentação, na medida em que o recomeço da conta- gem do prazo prescricional se justifica por ter havido uma actuação dos órgãos titulares do poder punitivo, ilustra- tiva objectivamente de uma efectiva possibilidade de se vir a aplicar o Direito Penal no caso concreto. A prescrição é, com efeito, um instituto que revela uma lógica de relação punitiva pela qual é reclamado do Estado, titular do poder de punir, uma actuação célere e eficaz na definição e aplicação do Direito ao caso concreto. A interrupção da prescrição explica-se pela demonstração da capacidade e vontade de, justificadamente, actuar os meios conducentes ao exercício ou continuidade no exercício de acção penal, não podendo, assim, ser bastante qualquer actividade investigatória não reveladora daquela capacidade para interromper a prescrição. 8. Apesar de a proibição da analogia quanto à matéria da prescrição não estar, de modo literal, incluída na proibição da analogia quanto às normas incriminadoras e ser questionável a existência de um verdadeiro direito do agente a que a inércia do Estado na prossecução penal o beneficie, a proibição da analogia em matéria prescricional, nomeadamente quanto às causas de interrupção da prescrição, está sem dúvida justificada pelo referido controlo do poder punitivo do Estado através do Direito que criou, de modo que sem a verificação de factos previstos em lei penal (objeto de reserva de lei e inerente controlo democrático) como indiciadores de uma efectiva e sustentada vontade e capacidade punitiva do próprio Estado não será possível estabelecer causas interruptivas da prescrição. Assim, mesmo que a garantia da previsibilidade para os reais ou hipotéticos agentes dos crimes dos prazos pres- cricionais não baste para justificar a proibição da analogia, ela será imposta pelo menos pela segurança democrática, relativamente ao controlo do exercício do poder punitivo, o qual não pode ser exercido sem limites objectivos democraticamente estipulados. Pelo menos neste sentido, a proibição da analogia das normas relativas à prescrição partilha dos fundamentos da proibição da analogia relativamente aos fundamentos da incriminação e inserese no objeto de reserva relativamente à definição de crimes e penas, prevista no artigo 168.º, n.º 1, alínea b) , da Cons- tituição». Como resulta da lei, para o condenado que seja declarado contumaz, o prazo de prescrição da pena pro- longa-se indefinidamente até à sua localização. No artigo 126.º, n.º 3, do CP, a lei impõe um limite máximo para o alargamento do prazo de prescrição equivalente ao prazo normal acrescido de metade, mas desconta- -lhe todo o período de suspensão da prescrição [artigo 122.º, n.º 1, alínea d) , conjugado com o artigo 126.º, n.º 3, ambos do CP]. Esta solução legal tem por consequência que, enquanto vigorar a declaração de con- tumácia [125.º, n.º 1, alínea b) , do CP], verifica-se o facto suspensivo e a pena permanece indefinidamente suspensa até que cesse este facto suspensivo, pelo que não funciona o limite do artigo 126.º, n.º 3, do CP
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