TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

231 acórdão n.º 618/17 qualquer norma com fundamento em inconstitucionalidade. Esta modalidade de recurso tem como pressu- posto de admissibilidade que a recusa de aplicação da norma sindicada, com fundamento em inconstitucio- nalidade, integra a ratio decidendi da decisão recorrida. Tal não sucede nos presentes autos, o que obsta ao conhecimento do objeto do recurso. O tribunal a quo interpreta o artigo 97.º, n.º 2, do CEP, no sentido de que o instituto da contumácia, quando decretado após a condenação, não é aplicável aos casos de pena principal de multa convertida em prisão subsidiária, nos termos do artigo 49.º, n.º 1, do Código Penal. Tal entendimento decorre, segundo a decisão recorrida, da natureza da prisão subsidiária, que não corresponde a uma pena principal de prisão, mas apenas a uma sanção compulsória, natureza essa que se reflete no seu regime, o qual impõe a sua cessação logo que seja feito o pagamento, nos termos do n.º 2 do artigo 49.º do Código Penal, e/ou a sua substituição, nos termos do n.º 3 do mesmo preceito. Para sustentar a sua posição, o tribunal a quo louva-se numa cor- rente jurisprudencial com esse sentido (mas que não recusa a aplicação da norma por inconstitucionalidade). Daí concluir que «a declaração de contumácia prevista no artigo 97.º, n.º 2, do CEP, tendo em conta o seu elemento literal, apenas é conciliável com uma sanção de natureza privativa da liberdade enquanto pena principal, autónoma» e que «de acordo com a letra da lei usa-se a expressão pena de prisão, o que, em termos interpretativos só pode querer significar que a sua aplicação se circunscreve às penas de prisão ou medidas de seguranças, com a exclusão da pena de multa convertida em prisão subsidiária». Os argumentos de inconstitucionalidade que constam da decisão recorrida, nomeadamente a alusão à violação dos artigos 26.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, ambos da Constituição, surgem como elemento de interpre- tação da disposição legal – no sentido apontado –, senão mesmo como mero reforço argumentativo de um sentido normativo que já decorria inteiramente dos restantes elementos de interpretação; não foi, em todo o caso, o fundamento da decisão de excluir do âmbito do instituto contumácia os casos de pena principal de multa convertida em prisão subsidiária. Uma verdadeira e efetiva desaplicação, por inconstitucionalidade, da norma sindicada, implicaria que o Tribunal tivesse previamente chegado à conclusão de que a norma em causa era aplicável ao caso – isto é, de que o regime da contumácia previsto no artigo 97.º, n.º 2, do CEP, é aplicável aos casos de condenação em pena principal de multa substituída por prisão subsidiária, nos termos do artigo 49.º, n.º 1, do Código Penal –, mas que tal solução legal não poderia ser aplicada por força da sua incompatibilidade com a Constituição. Vale isto por dizer que o Tribunal recorrido não recusou efetivamente a aplicação da norma dos artigos 97.º, n.º 2 e 138.º, n.º 4, alínea x) , do CEP, com fundamento em inconstitucionalidade, desde logo porque não considerou que o regime da contumácia previsto no primeiro dos indicados preceitos legais seja aplicável aos condenados em pena principal de multa substituída por prisão subsidiária, nos termos do artigo 49.º, n.º 1, do Código Penal. Pelo exposto, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do objeto do recurso. 8. Tratando-se de recurso obrigatório, previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, não há lugar ao pagamento de custas, nos termos do artigo 84.º, n.º 1, do mesmo diploma legal. III – Decisão Pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento do objeto do presente recurso. Sem custas, por não serem devidas. Lisboa, 4 de outubro  de 2017. – Gonçalo de Almeida Ribeiro – Maria José Rangel de Mesquita –Joana Fernandes Costa –  Maria Clara Sottomayor (vencida de acordo com declaração de voto anexa)   – João Pedro Caupers.

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