TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

20 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL X – A norma do artigo 18.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 92/2015 (afetação de infraestruturas) – nos termos da qual todos os bens e direitos dos municípios que já estivessem afetos aos sistemas multimunicipais extintos deverão manter-se, até ao final da concessão, afetos ao sistema multimunicipal que resulta da agregação, havendo que celebrar novos contratos de cedência de infraestruturas, bens e direitos, ao abrigo dos quais se determinará a contrapartida respetiva a pagar aos municípios –, não procede a nenhuma extensão dos contratos em questão, pelo que a contrapartida devida pela afetação dos bens e direitos em causa no período que decorre até ao final da nova concessão deverá, naturalmente, estar prevista nos novos contratos de cedência de infraestruturas que, mediante acordo das partes, proce- dam às alterações decorrentes da nova relação de concessão; por outro lado, a manutenção da afetação dos bens e direitos em causa ao sistema multimunicipal do Centro Litoral de Portugal é estabelecida através do mesmo mecanismo previsto para os contratos de fornecimento e de recolha, e que consiste na transmissão da posição contratual das sociedades extintas para a nova sociedade; pelas mesmas razões, inexiste, neste âmbito, qualquer violação do princípio da autonomia do poder local. XI – Embora a norma do n.º 1 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 92/2015, determine que, mediante contrapartida, quaisquer bens e direitos, não só dos municípios, como também de entidades intermu- nicipais ou até de entidades gestoras dos respetivos sistemas municipais, sejam afetos ao sistema multi- municipal, se tal se revelar útil ou necessário para o bom funcionamento do sistema, seguramente, tal não sucederá por mero efeito da norma em questão, desde logo porque os bens e direitos abrangidos não são sequer identificados, sendo apenas objeto de uma referência muito vaga e que necessita de ser concretizada; por conseguinte, através da norma em apreciação não se procede a qualquer confisco nem se pode considerar violada a autonomia do poder local ou o direito de propriedade privada dos municípios, entidades intermunicipais ou entidades gestoras dos sistemas municipais. XII – Relativamente à ligação obrigatória ao sistema e a transmissão dos contratos celebrados entre os muni- cípios e as sociedades concessionárias, as obrigações em causa constam de um diploma legislativo, não se prevendo nas normas em apreciação qualquer controlo por parte do Estado, direta ou indiretamente, de mérito ou sequer de legalidade, sobre a atuação dos municípios, pelo que não se podem considerar violados os limites impostos pelo artigo 242.º à tutela administrativa sobre as autarquias locais. XIII – É incontestável que, tendo o Governo optado por extinguir a sociedade Águas do Mondego por decreto- -lei, e não através de uma deliberação da assembleia geral da sociedade, não atuou em conformidade com o disposto no Código das Sociedades Comerciais, porém trata-se de uma prática comum no orde- namento jurídico português, cuja razão decorre, por um lado, da titularidade simultânea, por parte do Governo, de poderes legislativos e administrativos, e, por outro, da inexistência, na Constituição, de um conceito material de ato legislativo que limite, sem mais, as opções do Governo a este nível. XIV– Embora o Estado, ao constituir uma sociedade comercial, formalize a intenção de pautar a sua atuação pelos ditames da lei comercial, não se pode desconsiderar a natureza legislativa desse ato de criação; um decreto-lei plasma certas opções do Governo, quanto à melhor forma de prosseguir o interesse geral, possuindo o Governo inteira legitimidade para, através de um decreto-lei, vincular a entidade em causa à lei comercial, tratando-se de uma opção legislativa; o Governo possui, ao abrigo da com- petência legislativa genérica que lhe é atribuída pelo artigo 198.º, n.º 1, alínea a) , da Constituição, o poder de alterar as políticas preexistentes e vertidas em decretos-leis, não tendo as diferentes conceções sobre a melhor forma de prosseguir o interesse geral de ficar cristalizadas, podendo ser revistas ao lon- go do tempo.

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