TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
192 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL irá agravar os custos financeiros, seja por diminuição do montante a mutuar, que se encontra intimamente ligado com o valor do prédio, seja por aumento do spread e demais condições contratuais. Se a recorrente, no livre exer- cício dos seus poderes enquanto proprietária, quiser fazer um destaque no terreno a vender, por exemplo, a área onde não se encontra implantada a sua edificação industrial, quer o processo burocrático é mais complicado, senão mesmo impossível, quer o retorno financeiro desse destaque, e posterior venda, será afectado pela servidão non aedificandi .». Todas as hipóteses enunciadas são, sem exceção, precisamente isso, meras hipóteses: a concretização do dano dependerá, em relação a todas elas, da efetiva inviabilização, por efeito da constituição da servidão, dos referidos negócios jurídicos, o que não constituiu sequer matéria de facto alegadas nas instâncias nem está minimamente projetado na dimensão normativa ora em apreciação; e depende, pelo menos, da vigência, no momento previsto para a sua celebração, que é incerto, de um plano de ordenamento do território que permita ao proprietário construir nesse terreno. E a verdade é que nem esse dado assume suficiente grau de previsibilidade, atenta a mutabilidade inerente ao quadro regulamentar aplicável (artigo 95.º, n.º 1, do RJIGT), modelado, em cada momento, por uma complexa e dinâmica avaliação legal e administrativa de interesses públicos de diversa natureza. A servidão non aedificandi de proteção das estradas impede o proprietário do terreno por ela onerado de construir, o que pode provocar prejuízos concretos que se refletem negativamente na esfera jurídica daquele; mas nem ela traduz, em si mesma, um dano constitucionalmente indemnizável, nem dela decorre necessá- ria e automaticamente um prejuízo concreto para os proprietários dos terrenos marginados por estradas ou auto-estradas. Podendo questionar-se se o legislador pode, à luz da Constituição, restringir o direito à indemnização, em caso de constituição de servidões non aedificandi , a determinados prejuízos concretos, como os previstos nas alíneas a) , b) , e c) do n.º 2 do artigo 8.º do CE, e excluí-la em relação a outros, atuais ou futuros, não se justifica a dúvida nos casos, como o presente, em que a vantagem suprimida é a perda da mera possibilidade abstrata de, no futuro, se vir a construir no terreno contíguo à estrada. Nem o artigo 62.º da Constituição, nem o artigo 13.º da mesma Lei Fundamental, impõem ao Estado que indemnize prejuízos abstratos, dessa ou doutra natureza. 9. O artigo 62.º prevê, no seu n.º 2, que a requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efetuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização. É defensável, e o Tribunal Constitucional já o afirmou precisamente a propósito de servidões, que a obrigatoriedade constitucional de indemnizar o expropriado se aplique, não apenas às expropriações clássicas – que determinam, por razões de interesse público, a ablação ou transmissão forçada da própria titularidade do direito de propriedade do particular – mas a todas as situações em que, não havendo perda do direito de propriedade, há uma afetação da própria substância económica do direito, isto é, do seu núcleo essencial (expropriação de sacrifício, material ou de valor). De certo modo, a própria norma do n.º 2 do artigo 8.º do CE faz essa equiparação quando prevê que há lugar a indemnização nos casos em que a servidão inviabiliza a utilidade global do bem ou anula o seu valor económico, mandando aplicar-lhes os critérios de determinação da indemnização devida pela expropriação, como se desta se tratasse. A hipótese normativa em causa não é, contudo, equiparável a uma expropriação, na perspetiva relevante da perda da utilidade económica do bem afetado, sendo certo que o proprietário de um terreno marginado por uma estrada, apesar da constituição da servidão, pode continuar a usar e usufruir do essencial das utili- dades económicas que o terreno lhe proporcionava.
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