TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

19 acórdão n.º 707/17 justifica que o Governo tenha uma visão sobre a globalidade dos sistemas de que é titular, na medida em que, com a agregação dos sistemas, é potenciada a criação de economias de escala, que contribuam para a maior eficiência dos sistemas no seu conjunto; o outro objetivo fixado para a reforma, e que consiste na eliminação de assimetrias entre os sistemas multimunicipais do interior e do litoral do país, é igualmente legítimo, sendo uma tarefa fundamental do Estado a promoção do desenvolvimento har- monioso de todo o território nacional; trata-se, naturalmente, de um interesse nacional, que transcende o meramente local, não podendo o Governo, na sua prossecução, afetar indevidamente as competências dos municípios, mas pode organizar territorialmente de forma diferente os sistemas multimunicipais, de que, afinal, já é titular; por conseguinte, não se afigura que a agregação de sistemas multimunicipais – e a inerente extinção dos sistemas multimunicipais integrados – estabelecida pelo Decreto-Lei n.º 92/2015, constitua uma violação da garantia da autonomia do poder local. VII – Ainda no plano da agregação dos sistemas multimunicipais não se verifica violação da autonomia patrimonial do poder local, em virtude de lesão do direito de propriedade dos municípios; com efeito, os bens e infraestruturas em causa pertencem aos municípios ou à sociedade extinta, por conseguinte, não é devida aos municípios em questão qualquer compensação suplementar. VIII– Quanto à obrigação de ligação ao sistema multimunicipal agregado e transmissão das posições contra- tuais (artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 92/2013 e artigos 2.º, n.º 6, 15.º, 16.º e 18.º do Decreto-Lei n.º 92/2015) é admissível, à luz da garantia da autonomia local, a obrigação de ligação aos sistemas multimunicipais, sendo constitucionalmente admissível a criação e subsequente agregação de sistemas multimunicipais, da titularidade do Estado; tal significa que os serviços em alta de abastecimento de água e de saneamento (a montante da distribuição de água ou a jusante da coleta de esgotos e sistemas de tratamento de resíduos sólidos), nas situações em que foram criados sistemas multimunicipais, passaram a constituir uma atribuição do Estado e não dos municípios, os quais são utilizadores dos sistemas multimunicipais; em consonância, a faculdade, prevista no n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 92/2013, de, por razões ponderosas de interesse público, não se aplicar a obrigatoriedade de ligação ao sistema só faz sentido se for configurada como uma exceção à regra, dependente do reconhecimento de razões ponderosas de interesse público nesse sentido, pois a admissibilidade generalizada desta pos- sibilidade equivaleria a reconhecer, a jusante, a desnecessidade da criação do sistema multimunicipal e, portanto, a sua ilegitimidade constitucional. Admitindo-se a criação do sistema multimunicipal, mostra-se racionalmente necessária a imposição de ligação ao mesmo. IX – No que respeita à norma do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 92/2015, que estabelece que, enquanto não forem celebrados novos contratos, se mantêm em vigor os que tinham sido celebrados com as sociedades concessionárias extintas, entendendo-se as referências aí feitas àquelas sociedades como sendo feitas à sociedade Águas do Centro Litoral, dado que é admissível a exigência de ligação aos sistemas multimunicipais, quando estes tenham sido criados, a imposição aos municípios de um novo contratante, em substituição dos que, através do Decreto-Lei n.º 92/2015, são extintos, não constitui, nos moldes em que é efetuada, uma interferência ilegítima do Estado na esfera autónoma de decisão que, constitucionalmente, é garantida ao poder local; não pode considerar-se que a circunstância de a obrigação de ligação ao sistema não abranger todos os municípios constitua uma violação do princípio da igualdade, pois só é admissível a criação de sistemas multimunicipais quando exista um interesse nacional que justifique a intervenção do Estado, sendo precisamente ao Estado que cabe determinar em que situações esse interesse nacional se verifica, em função das necessidades de prestação de ser- viço público essencial, sendo certo que não existe nenhuma imposição constitucional de que todo o território nacional seja coberto por sistemas multimunicipais.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=