TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

189 acórdão n.º 608/17 O novo Estatuto entrou em vigor em 27 de julho de 2015 (artigo 6.º da Lei n.º 34/2015), aplicando-se, apenas, aos procedimentos pendentes para apreciação e decisão final à data da sua entrada em vigor (artigo 4.º, n.º 3, da Lei n.º 34/2015), não sendo, por isso, aplicável ao caso dos autos.  De todo o modo, é de sublinhar que ambos os diplomas legais prevêem um regime que, sendo distinto nas soluções consagradas, é aplicado por igual a todos os prédios que se encontram em relação de vizinhança ou em situação de proximidade espacial com estradas ou auto-estradas da rede rodoviária nacional.  A «zona de servidão non aedificandi » constitui-se com a publicação da planta parcelar da via rodoviá- ria a construir (artigo 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 248-A/98, de 6 de julho, e artigo 32.º, n.º 3, da Lei n.º 34/2015), e existe em relação a todos os prédios confinantes àquelas específicas vias de comunicação, com uma amplitude física que, na vigência do Decreto-Lei n.º 248-A/98, era pré-determinada em função do tipo de edifício ou construção abrangido pela proibição legal.  A recorrente em nenhum momento questiona a necessidade e adequação das restrições legais a que o seu prédio – e os restantes prédios nas mesmas condições espaciais – ficaram sujeitos por efeito da constru- ção da auto-estrada regulada no citado Decreto-Lei n.º 248-A/98; é um dado não controvertido no plano constitucional que elas, em si mesmas, visam a realização de interesses públicos e são necessárias, adequadas e proporcionais à realização desses interesses, com o sentido que o princípio da proporcionalidade assume no complexo valorativo formado pela Constituição.  O que a recorrente defende é que, mesmo nesses casos, em que o Estado prossegue finalidades de reconhecido interesse público, a perda da faculdade de edificar, que o direito de propriedade lhe confere em relação à totalidade do terreno que constitui objeto desse direito, constitui, só por si, um dano que, por força desse direito e do princípio da igualdade, ambos tutelados pela Constituição, deve ser indemnizado.  Vejamos. 6. Está essencialmente em causa um problema de responsabilidade civil do Estado; mais concretamente, saber se a perda da potencialidade edificativa decorrente da constituição de uma servidão non aedificandi , de proteção a uma auto-estrada, constitui um prejuízo que, por força da Constituição, deve ser transferido ou imputado ao Estado.  A regra geral, em relação aos danos, é a de que devem ser suportados por quem, até à sua ocorrência, beneficiou das vantagens perdidas. Não faria sentido nem seria justo fazer recair sobre a esfera jurídica de ter- ceiros a perda de uma vantagem que, até à ocorrência do dano, apenas beneficiou o lesado (António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, 3.ª edição, 2005, p. 419).  O dano traduz-se «na supressão ou diminuição duma situação favorável que estava protegida pelo orde- namento» (António Menezes Cordeiro, ob. cit. , p. 419), distinguindo-se, desse modo, do dano naturalístico ou meramente factual.  O que importa reter, na noção jurídica de dano, é que a sua aferição não pode deixar de ser feita em função das soluções adotadas pelo Direito em relação à tutela do interesse (material ou outro) em causa; a supressão ou diminuição de uma situação que se apresenta como favorável a determinada pessoa, numa perspetiva econó- mica, material ou moral, pressupõe, desde logo, que o interesse afetado seja juridicamente tutelado.  No caso concreto, a recorrente invoca, como prejuízo cuja reparação é constitucionalmente exigível, a perda ou redução da aptidão edificativa que o seu terreno detinha, antes da constituição da servidão, à luz dos critérios enunciados no n.º 2 do artigo 25.º do Código das Expropriações.  Importa, assim, determinar previamente em que consiste a faculdade de edificar que, na hipótese nor- mativa em análise, é afetada (ou eliminada) pela constituição de uma servidão non aedificandi de proteção a estradas ou auto-estradas. 7. É matéria controversa a questão da origem e natureza jurídica da faculdade de edificar, havendo quem a considere parte originariamente integrante do direito de propriedade privada (tese privatística), ainda que sujeita a limites e restrições (imanentes ao próprio direito ou externas a ele), e quem a exclua do conteúdo

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