TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
186 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL avaliação do Tribunal Constitucional, a densificação normativa de um dano substancialmente equiparável ao causado pela expropriação, reclamando, por isso, do mesmo modo, a «justa indemnização» que a Constitui- ção impõe como condição de validade da expropriação (artigo 62.º, n.º 2). 3. A primeira – e até agora única – viragem ocorrida nessa forma de ver verificou-se com a prolação do Acórdão n.º 525/11. No processo que deu origem ao recurso apreciado nesta decisão, estava também em causa uma servidão non aedificandi de proteção de uma auto-estrada; contudo, contrariamente ao que sucedia nos anteriores recursos de constitucionalidade, a servidão em que se fundava a pretensão indemnizatória do particular não tinha sido precedida de uma expropriação sobre o mesmo prédio. O terreno em causa, classificado como apto para construção, fora simplesmente marginado por uma auto-estrada, constituindo-se, por efeito disso, uma servidão non aedificandi . Neste contexto, foi o Tribunal confrontado com o problema de saber se a norma do n.º 2 do artigo 8.º viola a Constituição quando «condiciona a atribuição de uma indemnização apenas às utilidades atuais que estavam dadas à parcela onerada e não [tem] em conta as suas potencialidades edificati- vas [à data da constituição da servidão]». Reconheceu-se, em apreciação dessa nova questão, que a servidão não esvaziava, nesse caso, o con- teúdo ou o núcleo essencial do direito de propriedade, não constituindo, pois, nem mesmo numa perspetiva substancial ou de valor, uma expropriação. A servidão limitava o uso do solo, impedindo o seu titular de nele construir, no futuro, mas não despojava o proprietário da «substância económica» do seu direito, que continuava a recair, tal como no passado, sobre a totalidade do terreno, embora limitado na sua aptidão construtiva. Considerou-se, contudo, que o menor impacto lesivo da intervenção do Estado, em tal hipótese norma- tiva, não poderia justificar, sob pena de inconstitucionalidade, a denegação de indemnização: «uma servidão non aedificandi do tipo que está em apreciação (…) não deixa de constituir uma limitação singular e indivi- dualizada do uso do solo, que obriga o respetivo proprietário a uma contribuição acrescida para a satisfação daquele interesse público concreto e, nessa medida, o coloca em situação desigual relativamente aos demais proprietários. Ou seja, a proibição de construir constitui um encargo que, incindindo especialmente sobre o proprietário do prédio onerado, se traduz no sacrifício de um fator de valorização do solo (a aptidão edi- ficativa) que (…) é atendível para o cálculo da indemnização, nos casos em que o terreno é expropriado». Por essa razão, agora centrada no princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos, de que a norma do n.º 2 do artigo 62.º da Lei Fundamental seria expressão máxima, concluiu-se que também nessa situação é constitucionalmente devida uma reparação da perda ou diminuição patrimonial sofrida pelo particular atingido pela servidão non aedificandi . Sustentou-se, contudo, nesse aresto, que, não estando em causa um ato público de intervenção subs- tancialmente equivalente ao da expropriação, atenta a (diferente) natureza e o (menor) grau de compro- metimento da função ou utilidade económica essencial da propriedade onerada pela servidão, já não era constitucionalmente exigível que a reparação devida, em tais situações, tivesse o mesmo regime que o con- sagrado para as expropriações. Oferecendo o ordenamento jurídico meios genéricos e alternativos de tutela indemnizatória da perda sofrida pelo particular onerado por uma servidão imposta por razões de interesse público, como o mecanismo da «indemnização pelo sacrifício» previsto no artigo 16.º do Regime da Res- ponsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, era de considerar satisfeita a proteção exigida pelo princípio constitucional da igualdade na repartição dos encargos públicos. Por essa razão, mas apenas por essa razão, ancorada numa «visão sistémica» do ordenamento jurídico, não se julgou inconstitucional a norma do artigo 8.º, n.º 2, do Código das Expropriações, juízo de não inconstitucionalidade que o tribunal a quo aplicou no caso sub judicio . Esse o atual estado de discussão, no seio da jurisprudência constitucional, do problema de inconstitu- cionalidade equacionado no presente recurso.
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