TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
168 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL todos os sujeitos que residam, estejam estabelecidos ou se desloquem ocasionalmente na área do município, e ainda que de ummodo muito difuso, “dão causa” às atividades de proteção civil – porque a sua simples presença pode condicioná-las ou moldá-las, determinando o seu conteúdo – ou delas “beneficiam”, pelo menos poten- cialmente. E renova-se a conclusão então afirmada: se assim é, perde-se a conexão característica dos tributos comutativos, num duplo sentido: perde-se do lado dos beneficiários, que não são suscetíveis de delimitação, porquanto a “causa” da atividade e o “benefício” dela decorrente se diluem na generalidade da população; e perde-se do lado da prestação, por não ser individualizável, reconduzindo-se a uma atividade abstrata. Justifica-se, ainda, assinalar que, também na hipótese ora apreciada, a determinação dos sujeitos passivos é arbitrária: impor o tributo aos proprietários é tão desprovido de sentido e justificação como escolher os arrendatários, alguns ou todos os empresários ou qualquer outra categoria de sujeitos, uma vez que nenhum deles tem maior ou menor proximidade objetiva com a atividade a que se refere a taxa. No caso sub judicio , também podemos (re)afirmar que a “construção” justificativa consistente na agregação em bruto de toda a atividade municipal de proteção civil a título de prestação não pode esconder que, desse modo, se ficciona, artificiosamente, uma prestação concreta com base num conjunto indiferenciado de atos sem destinatários individualizados que se reconduzem a uma atividade abstrata, sendo certo que o mesmo método – separar uma determinada área de atividade de uma pessoa coletiva pública, calcular os seus custos e fazê-los refletir (ainda que parcialmente, mas em bloco) sobre um conjunto maior ou menor de sujeitos – pode fazer-se para qualquer outro serviço público local ou estadual (educação, justiça, saúde, defesa, segurança, por exemplo), mas não traduz, manifestamente, um recorte suficientemente definido de prestações concretas da entidade pública e dos sujeitos que a elas dão causa ou delas beneficiam, nem existem elementos que suportem, neste âmbito, uma presunção suficientemente expressiva – forte – de uma relação de troca. Em suma, na justificação económica da TMPC encontram-se elementos que, à semelhança do que ocorria com o tributo criado pelo município de Vila Nova de Gaia, são dificilmente compatibilizáveis com a estrutura bilateral da taxa – designadamente, a descrição muito genérica e abrangente do conjunto das atividades de pro- teção civil, a “identificação dos processos” que “conduzem a serviços” ligados à proteção civil como (alegada) expressão de um nexo entre prestações, a agregação indiscriminada dos custos da globalidade dos serviços de proteção civil e a distribuição praticamente arbitrária desses custos por categorias de sujeitos passivos. Estes elementos estruturais do tributo – comuns às hipóteses dos presentes autos e à encarada pelo Tribunal no Acórdão n.º 418/17 – representam um primeiro obstáculo à qualificação da TMPC como taxa. 2.5.2. Às características apontadas da TMPC, que a aproximam do tributo equivalente de Vila Nova de Gaia, somam-se outras próprias daquela. A incidência da TMPC revela uma estrutura análoga ao IMI, como justamente observou o requerente. A sobreposição dos regimes é inegável – ambos os tributos incidem sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis e o sujeito passivo da TMPC é determinado por remissão para as regras do IMI. Tal semelhança estrutural não é inócua. Ela revela que o tributo não assenta na correlação económica das prestações – e, nessa medida, prescinde do nexo característico dos tributos bilaterais, já que não pode guiar-se por uma ideia de proporcionalidade entre elas –, mas sim (e inequivocamente) na capacidade contributiva dos sujeitos passi- vos, revelada pela titularidade do direito sobre os prédios. Não é possível reconstituir qualquer relação suficientemente definida, certa e objetiva entre o conteúdo e valor das prestações do serviço municipal de proteção civil, por um lado, e o valor a suportar pelos titulares dos prédios, por outro. O Município de Lisboa sustenta que os proprietários dos prédios são “[…] os […] beneficiários principais” da TMPC, na medida em que “[…] a atividade da proteção civil do Município de Lisboa está em larga medida ligada ao património edificado, traduza-se ela em operações de socorro a incêndios, em intervenções por ocasião de inundações, em ações de proteção ditadas pelo estado degradado ou em ruína de imóveis […]”, sendo por isso “’normal’ e mesmo ‘expectável’ que a Câmara Municipal de Lisboa, em face das atribuições que lhe são cometidas por lei, desenvolva um conjunto de ações concretas de proteção civil de que são principais beneficiários os proprietários de prédios urbanos situados no concelho”,
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