TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
144 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – A jurisprudência constitucional acolheu, ainda, uma noção ampla de taxa, podendo esta expressar-se na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares (Acórdão n.º 177/10, no qual estava em causa uma taxa camarária pela afixação de painéis publicitários em prédio pertencente a particular). V – A designada “Taxa Municipal de Proteção Civil de Lisboa” (TMPC), prevista no Regulamento Geral de Taxas, Preços e outras Receitas do Município de Lisboa (RGTPRML, na versão republicada pelo Aviso n.º 2926/2016, no Diário da República , 2.ª série, n.º 45, de 4 de março de 2016), incide, em parte, sobre o valor patrimonial dos prédios em geral (n.º 1 do artigo 59.º do RGTPRML). VI – Ora, as atividades do município na área da proteção civil, a que se refere a TMPC, na modalidade identificada em V, não permitem estabelecer uma relação – efetiva ou presumida – com específicas pessoas ou grupo que delas sejam causadores ou beneficiários, perdendo-se a conexão característica dos tributos comutativos, num duplo sentido: do lado dos beneficiários, que não são suscetíveis de delimitação, porquanto a “causa” da atividade e o “benefício” dela decorrente se diluem na generalida- de da população; e do lado da prestação, por não ser individualizável, reconduzindo-se a uma ativida- de abstrata. A determinação dos sujeitos passivos é, neste caso, arbitrária e a “construção” justificativa consistente na agregação em bruto dos custos de toda a atividade municipal de proteção civil a título de prestação simplesmente ficciona uma prestação com base num conjunto indiferenciado de atos sem destinatários individualizados. VII – A incidência da TMPC revela uma estrutura sobreponível ao IMI, tornando claro que o tributo não assenta na correlação económica das prestações – e, nessa medida, prescinde do nexo característico dos tributos bilaterais, já que não pode guiar-se por uma ideia de proporcionalidade entre elas –, mas sim na capacidade contributiva dos sujeitos passivos, revelada pela titularidade do direito sobre os prédios. VIII– Ao contrário de outros tributos que o Tribunal aceitou como (ainda) correspondentes a taxas (cfr. Acórdãos n. os 65/07, 316/14 e 179/15), não existe uma evidente proximidade funcional entre a “pres- tação” e os sujeitos onerados com o tributo que permita estreitar o universo dos beneficiários, possibi- litando reconhecer uma presunção de benefício (que vai pressuposta na – e revelada pela – estrutura do tributo) suficientemente forte. Na TMPC a presunção é fraca, ou mesmo, eventualmente, vazia de conteúdo. O espectro dos supostos beneficiários é demasiado alargado, a invocada presunção não tem contornos definidos e, nessa medida, não pode afastar-se com segurança o seu caráter arbitrário, dado que a relação entre prestações é vaga e indireta, ao ponto de quebrar os nexos essenciais ao estabeleci- mento das correlações presumidas. IX – Assim, a relação comutativa que deveria estar pressuposta numa verdadeira taxa não se encontra a partir de qualquer dos elementos objetivos da TMPC, na modalidade identificada em V, nem pode assentar validamente em analogias com sinalagmas contratuais ( v. g. , por assimilação à figura do segu- ro), pelo que o referido tributo não consubstancia uma taxa. X – A TMPC, incide, ainda, em parte, sobre o valor patrimonial dos prédios “com risco acrescido por relação com a condição de degradado, devoluto ou em estado de ruína” (n.º 2 do artigo 59.º do RGTPRML). XI – Embora os prédios degradados, devolutos ou em estado de ruína representem um risco acrescido de
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