TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

128 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Os pressupostos em que assenta este regime não se verificam quando o trabalho é prestado, não em con- dições de mercado, mas no universo normativo, relativamente diverso, do serviço público. No âmbito deste, a presunção de que, independentemente do valor da retribuição auferida, há um dano laboral a reparar, não tem razão de ser; não tem porque, como vimos, os acidentes e as doenças em serviço não produzem, em princípio, uma perda de capacidade de ganho, em virtude das características próprias do emprego público. Com efeito, o tratamento de todos os trabalhadores como iguais perante a lei justifica a adoção de regimes de acumulação diferentes no domínio do trabalho comum e em funções públicas. E se é verdade que assiste razão ao requerente quanto refere que «há trabalhadores em funções públicas submetidos, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais, ao Código do Trabalho e à LAT» – veja-se o artigo 2.º, n.º 4, do RAS –, trata-se de uma solução de caráter excecional, que delimita negativamente a regra de que o RAS se aplica aos trabalhadores em funções públicas (artigo 2.º, n.º 1), solução esta porventura fundada em razões de ordem diversa das que temos vindo a considerar e cuja apreciação da constitucionalidade, em todo o caso, não integra o objeto do pedido. Às diferenças decisivas que ressaltam da comparação entre trabalhadores sujeitos ao regime comum e em funções públicas – e com base nas quais se pode afirmar que a lei trata os grupos que integram o par comparativo como iguais do ponto de vista das vantagens patrimoniais atribuídas –, importa acrescentar que não é idêntica a posição das entidades responsáveis pelo pagamento das pensões. No âmbito do regime comum, a responsabilidade recai sobre entidades seguradoras, remuneradas através de prémios pagos pelos empregadores ao abrigo do regime de seguro obrigatório; consequentemente, se o trabalhador parcialmente incapacidade, beneficiário de uma pensão que visa compensar a sua perda de capacidade de ganho, não vier a sofrer qualquer perda de rendimentos do trabalho, são os próprios empregadores, no gozo da sua autonomia privada, a suportarem os encargos da redundância. Pelo contrário, no âmbito dos infortúnios laborais em funções públicas – em que é afastado o princípio do seguro obrigatório [artigo 26.º, n.º 2, da Lei n.º 4/2009, de 29 de janeiro (RPS)] –, quer a remuneração dos trabalhadores, quer as pensões por incapacidade per- manente, são financiadas exclusivamente através de verbas públicas, nomeadamente receitas fiscais, sendo certo que as entidades empregadoras públicas suportam os encargos daquelas pensões e que o Orçamento do Estado «responde» subsidiariamente pela insuficiência dos recursos afetos a esse fim (artigo 22.º, n.º 3, do RPS). Deste ponto de vista, a proibição de acumulação entre a pensão por incapacidade e a parcela cor- respondente da retribuição – e, de modo derivado, entre aquela e a totalidade da pensão por aposentação – destina-se a acautelar a racionalidade da despesa pública neste domínio.  Resta, por tudo quanto se disse, concluir que as normas constantes da alínea b) do n.º 1 e dos n. os 3 e 4 – quanto a este último, no segmento em que remete para aquelas – do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, na redação dada pelo artigo 6.º da Lei n.º 11/2014, de 6 de março, não violam o prin- cípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição. III – Decisão Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide não declarar a inconstitucionalidade, com força obriga- tória geral, das normas constantes da alínea b) do n.º 1 e dos n. os 3 e 4 – quanto a este último, no segmento em que remete para aquelas normas – do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, na redação dada pelo artigo 6.º da Lei n.º 11/2014, de 6 de março. Lisboa, 21 de novembro de 2017. – Gonçalo de Almeida Ribeiro – Maria José Rangel de Mesquita – Maria de Fátima Mata-Mouros (com declaração) – Pedro Machete (com declaração) – João Pedro Caupers – Lino Rodrigues Ribeiro (com declaração) – Fernando Vaz Ventura – José Teles Pereira (vencido nos termos da declaração junta) – Joana Fernandes Costa (vencida nos termos da declaração junta) – Catarina Sarmento e

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