TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
126 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL abrangidos pelo regime comum, em virtude do reconhecimento constitucional – expresso e cardinal – da igual dignidade social de todos os cidadãos. Sobre o alcance geral do princípio da igualdade enquanto norma de controlo judicial do poder legisla- tivo, escreveu-se no Acórdão n.º 409/99: «O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente dife- rente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fun- damentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio.» A questão que se coloca, pois, é a de saber se as normas sindicadas, ao tratarem de modo diferente – através de regimes diversos de acumulação de prestações – trabalhadores em funções públicas e do regime comum, estabelecem entre eles uma distinção arbitrária, porque destituída de fundamento racional. Para res- ponder a tal questão, é indispensável que se determine qual o ponto de vista ou termo de comparação entre os sujeitos a tratamento diferenciado, o que pressupõe a identificação da ratio legis . A diferença de tratamento será racional se for ditada pelo desiderato da lei – atente-se, por exemplo, na distinção entre automóveis ligeiros e pesados no regime que estabelece os limites de velocidade na circulação rodoviária. E a diferença de tratamento será arbitrária se não tiver qualquer relação, ou uma relação razoavelmente comensurável, com a ratio legis , como seria o caso se a lei estabelecesse limites de velocidade diversos consoante a proveniência geográfica do construtor do automóvel. Chega-se a estas conclusões, como é bom de ver, através da determi- nação, ainda que implícita, de um termo de comparação entre as pessoas ou situações diferenciadas pela lei; no caso dos limites de velocidade, cuja finalidade é mitigar o risco de acidentes e dos danos emergentes da sua ocorrência, o tertium comparationis integra as propriedades dos veículos que os tornam mais ou menos perigosos e mais ou menos aptos a provocar danos em caso de acidente – contando-se entre tais propriedades a massa do veículo, mas não a origem do seu construtor. A finalidade da reparação por infortúnio laboral – como vimos – é a de compensar a perda de capaci- dade de ganho do sinistrado. Daí decorre que o ponto de vista mais relevante na comparação entre o regime comum e o regime especial dos trabalhadores em funções públicas, designadamente no que respeita à acu- mulação de prestações pecuniárias, é a vantagem patrimonial atribuída à vítima de infortúnio laboral. Ora, já sabemos quais são as razões pelas quais o legislador estabeleceu as proibições de acumulação que constam do artigo 41.º, n.º 1, alínea b) , e n. os 3 e 4 – quanto a este último, no segmento em que remete para aquelas –, do RAS. Importa agora indagar a razão de ser do regime – diametralmente oposto – estabelecido pelo artigo 51.º, n. os 1 e 2, do RAT. Se dessa indagação resultar que a posição patrimonial do trabalhador comum vitimado por infortúnio laboral em nada de relevante se distingue da que caracteriza o trabalhador em fun- ções públicas, o Tribunal concluirá, prima facie , pela violação do princípio da igualdade; pelo contrário, se a posição patrimonial for diversa, ao ponto de justificar razoavelmente a diferença de tratamento, impõe-se a formulação do juízo de sentido contrário. 15. Qual a justificação para o regime comum admitir a acumulação, sem reservas ou limites, da retribui- ção com a pensão por incapacidade permanente parcial e desta com a pensão de reforma? A razão principal prende-se com o facto de a lei atribuir a faculdade e presumir a probabilidade de o empregador ajustar a retribuição do trabalhador em função da sua perda de produtividade, ou seja, de passar a remunerá-lo na proporção da sua capacidade residual de trabalho. Com efeito, o artigo 157.º, n.º 3, do RAT, permite que o empregador reduza a retribuição do trabalha- dor sinistrado por acidente de trabalho ou afetado por doença profissional até ao limite da sua «capacidade
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