TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
125 acórdão n.º 786/17 o dano laboral pressuposto pela reparação, como explicar a necessidade de determinação do coeficiente de incapacidade e da pensão correspondente? Por outras palavras, para quê fixar uma pensão cujo pagamento é suspenso, por não se verificar, afinal de contas, o pressuposto do direito que a tem por objeto? Por duas razões. Em primeiro lugar, o trabalhador, uma vez aposentado, tem direito ao pagamento da pensão por incapa- cidade, que prevalece sobre a pensão de aposentação, a qual é devida pela Caixa Geral de Aposentações (que, com a entrada em vigor do RPS, é reembolsada pela entidade empregadora pública) apenas na exata medida em que exceda aquela (artigo 41.º, n.º 3, do RAS). Esta solução – pagamento da pensão por incapacidade, acompanhada de dedução do seu valor na pensão de aposentação – assegura a igualdade entre os trabalhado- res aposentados atingidos e não atingidos por infortúnio laboral, dado que a carreira contributiva daqueles não é afetada pela incapacidade parcial adquirida. Em segundo lugar, sendo a razão de ser da suspensão o facto de o sinistrado prestar trabalho em funções públicas, este tem, como é evidente, direito ao pagamento da pensão no caso vir a ocorrer, por qualquer razão, a cessação do vínculo de emprego público. Nesse caso, a entrada do sinistrado no mercado de trabalho é condicionada pelo facto de possuir uma capacidade profissional reduzida, por efeito do infortúnio laboral que sofreu no serviço público – precisamente o pressuposto do direito do trabalhador a reparação. Por tudo quanto se disse, impõe-se concluir que as normas constantes da alínea b) do n.º 1 e dos n. os 3 e 4 – quanto a este último, no segmento em que remete para aquelas – do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, na redação dada pelo artigo 6.º da Lei n.º 11/2014, de 6 de março, não violam o direito dos trabalhadores a justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) , da Constituição. 14. A segunda questão de constitucionalidade colocada pelo requerente diz respeito ao confronto das normas sindicadas com o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição. Em causa está o facto de as proibições de acumulação contidas nessas normas não terem paralelo no regime comum dos acidentes de trabalho, nos termos do qual «[a] pensão por incapacidade permanente não pode ser suspensa ou reduzida mesmo que o sinistrado venha a auferir retribuição superior à que tinha antes do acidente, salvo em consequência de revisão da pensão» e «[a] pensão por incapacidade permanente é cumulável com qual- quer outra» (artigo 51.º, n. os 1 e 2, do RAT). Ora, entende o requerente que «[n]ão se revelam, na verdade, quaisquer especificidades da relação de emprego público que justifiquem desvios face ao regime aplicável à generalidade dos trabalhadores por conta de outrem, no quadro da LAT». Por outras palavras, nada justifica que os trabalhadores em funções públicas estejam sujeitos às proibições de acumulação introduzidas no RAS pela Lei n.º 11/2014, quando os trabalhadores abrangidos pelo regime comum dos infortúnios laborais podem acumular a totalidade da retribuição ou da pensão de reforma com a pensão por incapacidade per- manente parcial. Tendo em conta que, na fundamentação do seu pedido de apreciação desta segunda questão, o reque- rente mobiliza boa parte dos argumentos articulados a propósito da primeira questão que submete ao juízo do Tribunal Constitucional, importa começar por delimitar o âmbito específico ou residual daquela. Se a primeira questão consubstancia essencialmente um problema de justiça absoluta – o de saber se as normas sindicadas não violam o direito dos trabalhadores por elas abrangidos a justa reparação em caso de acidente de trabalho ou de doença profissional –, a segunda questão consubstancia essencialmente um problema de justiça relativa – o de saber se a divergência de regimes de acumulação entre o RAT e o RAS não ofende o princípio da igualdade, por impor uma desvantagem patrimonial aos trabalhadores em funções públicas vítimas de infortúnio laboral relativamente aos seus homólogos abrangidos pelo regime comum. São problemas de natureza diversa, de tal modo que, concluindo-se – como se concluiu – que as normas sindicadas não violam o direito dos trabalhadores a justa reparação por infortúnio laboral, nada obsta a que se conclua que violam outro direito fundamental, correspondente à vertente subjetiva do princípio da igual- dade: o direito dos trabalhadores em funções públicas a serem tratados pela lei como iguais aos trabalhadores
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