TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

103 acórdão n.º 786/17 22.º Nesta situação hipotética, a aplicação da norma constante da alínea b) , do n.º 1, do artigo 41.º do Decreto- -Lei n.º 503/99, impedindo a acumulação da pensão a título de incapacidade permanente com a correspondente parcela da remuneração, tem por resultado que os efeitos da lesão sofrida pelo trabalhador na sua capacidade geral de ganho não serão objeto de qualquer reparação efetiva enquanto se mantiver em funções. 23.º Capacidade gera1 de ganho que não tem a ver com a manutenção da remuneração auferida pelo trabalhador à data do acidente ou da doença, tanto mais que, nos termos do n.º 4 do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 503/99, as medidas aplicadas no regresso de trabalhador que sofra de incapacidade permanente que o impossibilite de exercer plenamente as suas anteriores funções não podem implicar redução da sua remuneração. 24.º Semelhante resultado viola o direito fundamental à justa reparação, reconhecido a todos os trabalhadores, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional, tal como foi incorporado, na sequência da revisão constitucional de 1997, na a1ínea f ) , do n.º 1, do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa, em alinhamento, aliás, com os instrumentos internacionais de direitos humanos (incluindo as dimensões de proteção firmadas sob a égide da Organização Internacional do Trabalho). 25.º Determinando a Constituição da República Portuguesa que a reparação por danos provindos do infortúnio laboral, consubstanciados em lesão ou doença, há de ser justa, cuidou já o Tribunal Constitucional desta dimensão material fundante, nos termos seguintes (colhidos no seu Acórdão n.º 433/16): «A ideia de justiça na reparação – retirada do próprio léxico da norma constitucional citada – comete o legislador na incumbência de facultar os melos necessários e adequados à efetivação desse direito dos traba- lhadores com vista à reparação dos danos sofridos pelas vítimas de um acidente de trabalho, a qual se procura efetiva e verdadeiramente dirigida à superação ou, não sendo tal possível, compensação dos danos na saúde e na capacidade e aptidão dos trabalhadores para a vida ativa e, em particular, para a atividade laboral.» 26.º Ora, à luz da referida dimensão material, o critério reparatório definido na lei, nas prestações periódicas por incapacidade permanente parcia1, por referência à redução na capacidade geral de ganho da vítima, exige que, na efetivação do correspondente direito fundamental do trabalhador – compreendido como um direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (veja-se, na doutrina constitucional, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª ed. rev., Coimbra Editora, 2007, p. 770, e, na jurisprudência do Tribunal Constitucional, o Acórdão n.º 612/08) – a reparação do dano não fique tolhida em uma compreensão estreita segundo a qual, subsistindo a remuneração do trabalhador vitima, se esvanece, na prática e na parcela correspondente, qualquer dano indemnizável. 27.º A este propósito e decaindo no tempo, recorde-se que a questão de «o salário auferido por trabalhador que sofre de certo grau de incapacidade permanente para o trabalho [ser cumulável] com a indemnização, traduzida em qualquer espécie de prestação, que lhe foi concedida» (Carlos Alegre, ob. cit. , p. 228) ficara já jurisprudencialmente estabilizada, em termos de princípios gerais, no quadro da vigência da legislação que precedera a Lei n.º 2127, de 3 de agosto de 1965 (Bases do regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais), originando, subsequentemente, soluções sob a forma de lei, que transitaram, no que ao regime geral tomado como referente pelo Decreto-Lei n.º 503/99 diz respeito, para o preceituado no artigo 36.º da Lei n.º 100/97, complementado

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