TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
94 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Desta resulta, ao invés, que, no âmbito da ponderação para que remete o regime consagrado no artigo 78.º do CEPMPL, o tribunal a quo atendeu, não a uma “alegada falta de interiorização da censurabilidade da sua conduta por parte de um arguido” – isto é, a uma ausência de interiorização retirada do plano da mera alegação –, mas ao que considerou ser um nível de interiorização efetivamente insuficiente, no sentido de comprovadamente carecido de consolidação. E resulta também que, para concluir pela incompatibilidade da saída requerida com a defesa da ordem e da paz social, o tribunal a quo atendeu, não ao “tipo legal de crime” pelo qual o arguido fora condenado, mas “ao crime” – isto é, ao facto criminoso – que justificou essa condenação. E justamente por ter sido ao crime – e não ao tipo legal de crime – que o tribunal a quo associou as “elevadas exigências de prevenção geral positiva” que entendeu verificarem-se no caso, não se pode concluir, como faz o recorrente, que, para afastar a verificação dos requisitos previstos no artigo 78.º do CEPMPL – em particular o contemplado na alínea a) do respetivo n.º 1 –, a decisão recorrida tenha desconsiderado as “circunstâncias con- cretas (factos provados na decisão condenatória, enunciados no requerimento em que o arguido solicitou a saída jurisdicional)” em que o mesmo foi praticado. É certo que, apesar de ter atentado no crime pelo qual foi o recorrente condenado, o tribunal a quo não fez menção, de forma singular e expressa, a cada uma das circunstâncias em que o mesmo foi perpetrado de acordo com o quadro factual traçado na decisão condenatória. Simplesmente, na consideração do crime cometido pelo arguido – isto é, do comportamento criminoso pelo mesmo levado a cabo –, está obrigatoriamente contida, ainda que de forma implícita, a consideração valorativa de todas as circunstâncias em que o mesmo foi perpetrado de acordo com o estabelecido na decisão condenatória – e, portanto, também daquelas que, nessa qualidade, foram invocadas no requerimento para a concessão da licença de saída. O que sucede é que a tais circunstâncias – cuja consideração se encontra necessariamente compreendida na referência “ao crime” cometido –, não foi reconhecido pelo tribunal a quo o significado de tornar compatível com as exigências de prevenção geral a saída pretendida, requerida a cerca de dois anos e três meses da sobrevinda do meio da pena em execução. Uma vez que os preceitos constantes das alíneas a) e b) do n.º 1 e alínea a) do n.º 2 do artigo 78.º do CEPMPL não foram interpretados e aplicados pelo tribunal a quo em qualquer um dos três sentidos impugnados pelo recor- rente, o objeto do recurso de constitucionalidade não pode ser conhecido quanto às questões especificadas sob os pontos 2., 4. e 5. do respetivo requerimento de interposição. 8. Tal como enunciada no ponto 3. do requerimento de interposição do recurso, a última das questões de cons- titucionalidade suscitadas pelo recorrente tem por objeto a “interpretação normativa do art. 191.º n. os 1, 2 e n.º 3” do CEPMPL, “no sentido de poderem ser vertidas na Ata supostas declarações indiretas alegadamente prestadas pelo arguido a membros do conselho técnico não identificados em concreto na Ata, não tendo o TEP procedido a audição direta do arguido”. No segmento ora considerado, o recurso de constitucionalidade tem, assim, por objeto, não a norma plasmada no n.º 2 do artigo 191.º do CEPMPL − que confere caráter meramente facultativo à audição do recluso no âmbito do processo de concessão da licença de saída jurisdicional –, mas uma dada interpretação, alegadamente extraída do conjunto dos preceitos contidos nos n. os 1, 2 e 3 do referido artigo, de acordo com a qual o Tribunal de Exe- cução de Penas, sem que tenha procedido à audição do arguido – isto é, tendo-a dispensado nos termos previstos no n.º 2 – , pode admitir que sejam “vertidas na Ata” que documenta a reunião do conselho técnico, “supostas declarações indiretas”, por aquele “alegadamente prestadas” a membros do referido órgão “não identificados em concreto” nessa mesma “Ata”. A par da falta de rigor que acompanha a delimitação da dimensão interpretativa assim pretendida sindicar – no sentido em que, na ata que documenta a reunião do conselho técnico, não se encontram vertidas quaisquer declarações, constando apenas, por súmula, a orientação expressa pelos respetivos membros quanto às condições que a decisão judicial deveria fixar no caso de conceder a licença de saída requerida –, facilmente se constata que os preceitos constantes dos n. os 1, 2 e 3 do artigo 191.º do CEPMPL não foram interpretados e/ou aplicados pelo Tribunal de Execução de Penas no sentido reputado inconstitucional.
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