TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
808 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 7. Tanto mais numa conjuntura em que cada vez mais os cidadãos se vêm afastando da participação na vida pública, pelo que deveria ser de louvar a sua vontade de participação nas lides autárquicas, ao invés de os impedir apenas com o fundamento de que são demasiados (por concorrem em lugares que lhes não garantem uma imediata eleição à primeira); 8. Ora, a aprovação da Constituição da República Portuguesa vincou claramente, dentro do elenco dos direitos e deveres fundamentais, os direitos, liberdades e garantias de participação política, nomeadamente o direito de participação na vida pública (art.º 48.º) e o direito de sufrágio (art.º 49.º), este um direito/dever cívico de qualquer cidadão; 9. E, se a anterior legislação eleitoral autárquica (afastada pela LEOAL – Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto) definia claramente um limite mínimo e um limite máximo de candidatos suplentes, o certo é que a atual Lei deixou de o definir, definindo apenas um limite mínimo de candidatos suplentes; 10. O que não foi certamente feito por mero lapso do legislador, até porque, por exemplo, noutra Lei Eleitoral (a Lei Eleitoral da Assembleia da República – Lei 14/79, de 16 de maio), o legislador manteve, até aos dias de hoje, a indicação do limite mínimo e limite máximo de candidatos suplentes (artigo 15.º n.º 1); 11. Acresce que nunca decorre qualquer prejuízo (nem para o Estado nem para Entidades Privadas) do facto de uma lista candidata a certa Assembleia de Freguesia ter um número de candidatos suplentes superior ao número de candidatos efetivos; 12. Uma vez que a lei é clara acerca de quais os candidatos que têm direito à dispensa das respetivas funções, públicas ou privadas – os candidatos efetivos e os suplentes no mínimo legal exigível (artigo 8.º LEOAL); 13. Sendo assim, não existe, salvo o devido respeito, qualquer razão de fundo para se impedir um vasto con- junto de cidadãos, providos da totalidade dos seus direitos e deveres de participação política, de todos fazerem parte da mesma lista de candidatos, antes sendo de louvar tal demonstração de cidadania; 14. E sendo ainda de valorizar a disponibilidade para o exercício de direitos e deveres fundamentais de parti- cipação política dos cidadãos, constitucionalmente consagrados, em detrimento de uma mera interpretação, ao de leve, daquilo que parece que o legislador queria dizer, mas não disse; 15. Aliás, diz-nos, resumidamente, Gomes Canotilho (in Direito Constitucional e Teoria da Constituição – pp. 447) que, na dúvida, ponderando entre o princípio da constitucionalidade e o princípio da legalidade, deverá o Tribunal optar pela defesa da norma constitucional, prevalecendo esta como norma superior, reconhecendo-se aos Tribunais o direito de acesso à Constituição – sobretudo às normas Constitucionais consagradoras de direitos, liberdades e garantias, a fim de fiscalizarem (direito de exame, direito de fiscalização) a conformidade da Lei com as normas e princípios da Constituição. Termos em que, pelos fundamentos supra expostos e ressalvando todo o devido respeito, deve o douto despacho de que se reclama ser revogado, decidindo-se, ao invés, pela admissão do candidato suplente apresentado sob o número 8 na presente lista à Assembleia de Freguesia de Rebordelo.» Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 7. A única questão colocada a este Tribunal diz respeito à interpretação do artigo 23.º, n.º 9, da LEOAL, preceito segundo o qual «As listas, para além dos candidatos efetivos, devem indicar os candidatos suplentes em número não inferior a um terço, arredondado por excesso». A Coligação “Afirmar Amarante”, recorrente nestes autos, entende que, na falta de uma indicação legal expressa de um limite máximo ao número de candidatos suplentes, esta norma deve ser interpretada à luz de
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