TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
77 acórdão n.º 211/17 ao artigo 44.º do CIRS introduzidas pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, em especial o aditamento dos novos n. os 5 e 6, com o seguinte teor: «5 – O disposto no n.º 2 não é aplicável se for feita prova de que o valor de realização foi inferior ao ali previsto. 6 – A prova referida no número anterior deve ser efetuada de acordo com o procedimento previsto no artigo 139.º do Código do IRC, com as necessárias adaptações.». 23. E são aqueles valores jurídico-constitucionais em presença que se mostram postergados pela norma (ou dimensão normativa) em análise. O princípio da capacidade contributiva, enquanto «princípio geral da imposição segundo a capacidade contributiva de cada um» (Acórdão n.º 211/03), exige que o legislador fiscal configure as obrigações dos contribuintes a partir de factos tributários que fundem a capacidade de suportar o encargo correspondente. Afirmou o Acórdão n.º 348/97 que «a tributação conforme com o princípio da capacidade contributiva implicará a existência e a manutenção de uma efetiva conexão entre a prestação tributária e o pressuposto económico selecionado para objeto do imposto». O primeiro fundamento deste princípio é encontrado no princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP), de modo a que a distribuição dos encargos tributários seja feita de acordo com a capacidade de cada um, isto é, exigindo-se um critério idêntico para todos os cidadãos na repartição de impostos e sendo esse critério o da capacidade contributiva (assim, no citado Acórdão n.º 348/97 e, mais recentemente, nos Acórdãos n. os 695/14 e 590/15). A capacidade contributiva é, assim, a medida da diferença. E, a partir da sua articulação com os demais princípios materiais da Constituição fiscal – em particu- lar o artigo 103.º da CRP – podemos retirar do princípio da capacidade contributiva, ao pressupor uma repartição justa dos encargos de acordo com a capacidade de cada um, a resposta à demanda constitucional de «uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza» (artigo 103.º, n.º 1), a que não deixa de se referir o Acórdão n.º 211/03 – e, bem assim, vê-lo concretizado no princípio de a tributação dever incidir sobre o «rendimento real» dos contribuintes (artigo 104.º, n.º 2), caso se admitisse que a disposição constitucional em causa tem um leque de destinatários mais vasto que o da sua letra e tomando-se por seguro, como faz José Casalta Nabais, que este preceito constitucional «mais não é do que uma concretização, uma explicitação dos princípios da capacidade contributiva e da igualdade fiscal» ( Direito Fiscal, cit., p. 171). O princípio da capacidade contributiva constitui, pois, como escreve Sérgio Vasques, «o pressuposto, o limite e o critério da tributação» (cfr. Manual de Direito Fiscal, reimpressão, Edições Almedina, S.A., Coim- bra, 2015, p. 296). Ora, estas exigências constitucionais não podem deixar de ser observadas nas normas de incidência tributária, configurando-se como princípios-garantia dos contribuintes. É que, na definição da incidência do imposto, a determinação da matéria coletável constitui um elemento essencial da relação jurídico-fiscal, quantificando a obrigação tributária e, assim, a medida do imposto devido. Deste modo, o legislador não pode fixar a medida do imposto sem atender à capacidade revelada pelo seu devedor. Aqui se revelam as virtualidades do princípio da capacidade contributiva: «constituindo a ratio ou a causa da tributação, este princípio afasta o legislador fiscal do arbítrio, obrigando-o a que (…) erija em objecto e matéria colectável de cada imposto um determinado pressuposto económico que seja manifestação dessa capacidade e esteja presente nas diversas hipóteses legais do respectivo imposto. Daqui decorre (…) a ilegitimidade constitucional das presunções absolutas de tributação» (José Casalta Nabais, Direito Fiscal, cit., pp. 154-155). É certo que, na determinação da matéria coletável, socorre-se muitas vezes o legislador de técnicas presuntivas, justificadas por razões de praticabilidade e simplificação do sistema fiscal. Sirva o expediente constante do artigo 44.º, n.º 2, do CIRS objetivos de praticabilidade, simplificação e eficiência na arrecada- ção de receitas fiscais (ao fazer prevalecer, sem mais, o VPT sobre o valor do preço declarado), sirva também
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