TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

75 acórdão n.º 211/17 tem insistentemente sublinhado não proibir aquele princípio que se criem distinções, desde que estas não sejam arbitrárias ou desprovidas de fundamento material bastante.  A fixação da matéria colectável constitui, por sua vez, um momento central de determinação do montante dos impostos, repercutindo-se no seu apuramento e, consequentemente, na vertente garantística dos cidadãos enquanto contribuintes. No desempenho desta tarefa, o legislador, em nome de razões de eficiência da Administra- ção Fiscal e do combate à evasão e à fraude neste domínio, apela a presunções, como técnica de melhor surpreender a realidade fáctica decorrente das diversas situações da vida, avalizadas por critérios de normalidade, socorrendo-se, desse modo, “de factos conhecidos para afirmar outros que desconhece”, e assim ultrapassar as dificuldades pro- batórias que a determinação da matéria colectável inevitavelmente levanta (cfr. Jorge Bacelar Gouveia, “A Evasão Fiscal na Determinação e Integração da Lei Fiscal”, in Ciência e Técnica Fiscal, n.º 373 [1994], p. 28).» No entanto, esse processo técnico há-de compaginar-se com o respeito pelo princípio da igualdade, por seu turno a congraçar-se com o princípio geral da imposição segundo a capacidade contributiva de cada um, o que não é já de admitir quando – voltando ao caso  sub judice – se aceite que, nos valores do acervo hereditário, uma quota de bens de determinada natureza aí esteja representada, absoluta e inilidivelmente. Ou seja, já não é de admitir, em nome daqueles princípios, uma tal mecânica apoiada em semelhante desrazoa- bilidade, alheia às decorrências da capacidade contributiva dos contribuintes, nos parâmetros constitucionais da igualdade e, em última análise, da “repartição justa de rendimentos e riqueza”, a que alude o n.º 1 do artigo 103.º da Constituição – entenda-se esse expediente técnico como ficção da existência de bens de uma dada natureza, ou uma presunção radicada em juízos de “normalidade” de certas situações de vida, uma incidindo mais significativa- mente no âmbito da formulação, outra mais ligada à prova (cfr. Francisco Rodrigues Pardal, “O Uso das Presunções no Direito Tributário”, in Ciência e Técnica Fiscal, n.º 325/327 [1986], p. 20).» É esta jurisprudência que se retoma no caso em apreço. 21. A norma contida no artigo 44.º, n.º 2, do CIRS, ao tomar por referência o VPT do imóvel, tem, como já se disse, a dupla finalidade de servir de pressuposto à sua aplicação e de determinar – com base naquele mesmo valor – a matéria sujeita a tributação como mais-valias. Recorde-se que a referência ou pressuposto relevante para o apuramento dos rendimentos (presumidos) obtidos com a alienação do imóvel parte da verificação de uma disparidade entre os valores da transação (a contraprestação) e da avaliação do imóvel para fixação do seu valor patrimonial tributário – esta feita de acordo com o regime fixado no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI, em especial, o artigo 38.º), servindo também o efeito de determinar a base coletável do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT). Com efeito, em matéria de impostos sobre o património – estáticos (IMI) ou dinâmicos (IMT) –, a base coletável é (ou pode ser) determinada a partir da avaliação do imóvel para efeitos de determinação do seu valor patrimonial tributável (VPT), uma técnica de «acertamento» que procura responder às exigências de procedimentos tributários de massas, fazendo prevalecer critérios unitários previa- mente fixados pelo legislador, cujo resultado pode não coincidir com o valor de mercado do bem avaliado. A virtualidade da referência tomada pelo legislador no artigo 44.º, n.º 2, do CIRS, parte do pressuposto de que aquele VPT é tendencialmente inferior ao valor de mercado dos bens imóveis, sendo, assim, também tendencialmente inferior ao valor pelo qual o bem é transacionado. Deste modo, sugere que qualquer tran- sação onerosa de bens imóveis terá por valor mínimo o VPT do imóvel. Ora, tal pressuposto não se verifica sempre ou não se verifica necessariamente, tendo em conta quer as variações dos preços de compra e venda praticados no mercado imobiliário (sendo este fortemente condicionado pela conjuntura económica, seja em períodos de crise, seja em períodos de expansão, a que acresce a sujeição a distorções várias decorrentes de outros fatores relevantes, designadamente, financeiros e fiscais), quer a variação do próprio regime de avaliação patrimonial dos imóveis para efeitos fiscais e da sua aplicação (seja pela atualização dos VPT, seja pela alteração dos critérios legalmente definidos para a fixação do VPT, seja ainda pelos processos generaliza- dos de avaliação ou reavaliação de imóveis, como é exemplo a determinação, pela Lei n.º 60-A/2011, de 30

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