TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
711 acórdão n.º 420/17 conteúdo. Assim, no Acórdão n.º 241/02, em que refere expressamente que ‘a proibição de ingerência nas teleco- municações, para além de vedar a escuta, interceção ou vigilância de chamadas, abrange, igualmente, os elementos de informação com elas conexionados, designadamente os que no caso foram fornecidos pelos operadores de telecomunicações’. A mesma interpretação foi retomada e amplamente desenvolvida no Acórdão n.º 486/09 (…). (…) Já quanto aos dados de base ( v. g. número de telefone, endereço eletrónico, contrato de ligação à rede) e aos dados de localização de equipamento, quando não dão suporte a uma concreta comunicação, não são objeto de proteção do direito ao sigilo das comunicações (cfr. Acórdão n.º 486/09). De facto, se o objeto de proteção é uma comunicação individual, então os dados que não pressuponham uma concreta comunicação, que não façam parte do processo de comunicação, ainda que protegidos pela reserva da vida privada – artigo 26.º da CRP – não estão cobertos pela tutela do sigilo das comunicações. Por tudo isso, também se entende que a área de proteção do sigilo das comunicações consagrada no n.º 4 do artigo 34.º da CRP, compreende tanto o conteúdo da comunicação como os dados de tráfego atinentes ao processo de comunicação. (…)» Esta diferença de tratamento também tem reflexos nos outros tribunais, levando a que «os tribunais superiores da jurisdição comum tenham vindo a conferir um tratamento diverso, no sentido de uma menor proteção – rectius , uma menos acentuada intangibilidade –, aos dados de base, colocando-os no plano das demais informações sujeitas a segredo profissional, nos termos do artigo 135.º do CPP (cfr. os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 19 de junho de 2014, proferido no processo n.º 1695/09.5PJLSB.L1-9, de 20/06/2013, proferido no processo n.º 1746/05.2TJLSB.L1-8, e de 18/01/2011, proferido no processo n.º 3142/09.3PBFUN-A.L1-5, todos disponíveis na base de dados da DGSI)» (cfr. ponto 9.2 do voto do Cons. José António Teles Pereira ao mesmo Acórdão n.º 403/15). Assim, decorre da jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria que a proteção confe- rida pelo n.º 4 do artigo 34.º da Constituição não abrange os dados de base, como os abrangidos pela norma objeto do presente processo. De facto, os dados relativos à mera identificação de um utilizador a quem estava atribuído um determinado endereço de protocolo IP não estão abrangidos pelo âmbito de proteção do sigilo das comunicações consagrado naquele preceito constitucional pois não pressupõe um ato de comunicação específico. Não se acompanha, portanto, o juízo do tribunal a quo, quanto à violação do n.º 4 do artigo 34.º da Constituição. 13. Os dados de base em causa estão, no entanto, sujeitos à proteção concedida pelo direito à reserva da vida privada, consagrado no artigo 26.º da Constituição. Assim sendo, é necessário aferir se a obrigatoriedade de os «fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações» conservarem «pelo período de um ano a contar da data da conclusão da comunicação», os dados relativos ao «nome e o endereço do assinante ou do utilizador registado, a quem o endereço do protocolo IP» estava atribuído «no momento da comunicação» constitui uma restrição destes direitos fundamentais e se tal restrição é desproporcionada, violando o artigo 18.º da Constituição. Ora, o dever de conservação destes dados para a sua eventual disponibilização às autoridades, nos termos da lei, pode ser vista como uma restrição aos direitos fundamentais referidos. A questão coloca-se, pois, na sua conformidade com o princípio da proporcionalidade. O princípio da proporcionalidade ocupa lugar central na avaliação dos requisitos materiais exigidos nas restrições de direitos fundamentais que, de acordo com o n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, devem «limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos». Importa, pois, começar por identificar o interesse público prosseguido pela norma sindicada. No presente caso, o interesse público é a «investigação, deteção e repressão de crimes graves por parte das autoridades competentes», tal como previsto no artigo 1.º, n.º 1, da Lei n.º 32/2008. Os crimes graves são definidos
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