TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

71 acórdão n.º 211/17 Ora, o artigo 44.º, n.º 2, do CIRS, ao definir o valor de realização por referência ao valor de avaliação do imóvel (para efeitos de liquidação do IMT), menciona os factos relevantes para a determinação da maté- ria coletável, habilitando o contribuinte a conhecer os termos em que será fixado o valor tributável. Sendo possível que, no momento da liquidação do imposto, não seja conhecido o resultado da avaliação do imóvel para o efeito da atribuição do valor patrimonial tributário (VPT), deve ter-se presente que a avaliação em causa obedece a critérios predefinidos (também pelo legislador: vd., para a determinação do VPT dos pré- dios urbanos, o artigo 38.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis – CIMI), servindo o VPT de base coletável a outros impostos (sobretudo sobre o património) como o IMI e o IMT. Deste modo, não se afigura, in casu , posta em causa a previsibilidade do encargo fiscal. Do exposto conclui-se que o parâmetro invocado – o princípio da reserva substancial de lei – não se mostra determinante para a apreciação do presente recurso, do mesmo não resultando um juízo de desvalor constitucional sobre a norma sub judice . Cumpre, pois, passar a analisar a questão de constitucionalidade colocada nos autos por apelo aos prin- cípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva, de seguida ponderados. 19. Tivemos oportunidade de enquadrar constitucionalmente o princípio da capacidade contributiva (cfr. supra , 17.2), enquanto concretização do princípio da igualdade (fiscal) e expressão de outros valores fun- dantes da Constituição fiscal (plasmados nos artigos 103.º e 104.º da CRP), não alheios à ideia de realização da justiça fiscal, pese embora o princípio não encontre formulação expressa na Constituição portuguesa. É neste princípio que a sentença recorrida funda a sua decisão de não aplicação da norma contida no artigo 44.º, n.º 2, do CIRS – interpretada no sentido de estabelecer uma presunção inilidível ou absoluta em matéria de apuramento das mais-valias decorrentes da alienação onerosa de bens imóveis (tomando por referência o VPT do imóvel quando superior ao valor da contraprestação devida pela compra) – por incons- titucionalidade. Ocorrendo a transação onerosa (no caso, uma compra e venda) de um bem imóvel, a mais-valia sujeita a tributação (seja na totalidade, seja numa determinada percentagem) corresponde à diferença entre o valor da aquisição do imóvel e o valor de realização da venda do mesmo, ou seja o ganho obtido pela diferença dos dois valores. Assim, quanto à definição do valor de realização de uma transação onerosa de bens imóveis, dispõe o artigo 44.º, n.º 1, alínea f ) , do CIRS que corresponderá o mesmo ao valor da contraprestação, ou seja, ao preço, sendo que – e segundo o n.º 2 do mesmo artigo – «tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida.»  O valor patrimonial tributário (os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre as transações onerosas de imóveis) a que se refere o artigo 44.º, n.º 2, do IRS, constitui, deste modo, um valor padrão escolhido como referência pelo legislador, a ser tido em conta desde que superior ao valor declarado na transação do imóvel em causa, sendo assim, por um lado, o pressuposto legal para a aplicação de um método de apuramento da matéria coletável não baseado na decla- ração do contribuinte e assumindo também, por outro lado, a finalidade de passar a ser considerado como o valor sobre o qual incide a tributação (no apuramento dos ganhos), definindo a medida da matéria coletável, pelo que constitui, do mesmo passo, uma norma de incidência tributária. O Juiz a quo qualificou a normação em causa como uma presunção inilidível ou absoluta, na medida em que, em face do apuramento da matéria sujeita a tributação com base no VPT do imóvel (porque superior ao valor da contraprestação), não seria facultado ao contribuinte uma forma de demonstrar que o valor de realização da transação onerosa do imóvel era efetivamente o valor da contraprestação (preço) constante da escritura pública (ou documento similar) de compra e venda.

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