TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
706 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL que respeita à inviolabilidade das comunicações, nomeadamente para efeito de investigação e repressão de infrações penais (artigo 1.º, n.º 4). Assim, na sequência desse diploma, foi aprovada a Lei n.º 32/2008, de 17 de julho que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 2006/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15/03, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações, que estabelece amplas garantias no que toca ao acesso e conservação dos dados de tráfego e de localização das comunicações para fins de investigação, deteção e repressão de crimes graves por parte das autoridades.» É de referir também que, posteriormente, foi aprovada a Lei do Cibercrime (Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro), transpondo para a ordem jurídica nacional a Decisão Quadro n.º 2005/222/JAI, do Conselho, de 24 de fevereiro, relativa a ataques contra sistemas de informação, e adaptando o direito interno à Convenção sobre Cibercrime do Conselho da Europa. O n.º 2 do artigo 11.º da Lei do Cibercrime vem estabelecer que as disposições processuais previstas no capítulo III daquela lei «não prejudicam o regime da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho». 8. Também é importante referir o enquadramento internacional da questão. Sobre a mesma, o Acórdão n.º 403/15, no seu ponto 11, elenca: «Assim, desde logo, o artigo 12.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem declara que ‘ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência (…)’. A mesma redação é retomada pelo artigo 17.º do Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos. Ambos os textos prescrevem que o indivíduo tem direito à proteção da lei contra tais intervenções ou tais atentados. O artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), por seu turno, estabelece que ‘qual- quer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência’. Nos termos do n.º 2, ‘não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infrações penais, a proteção da saúde ou da moral, ou a proteção dos direitos e das liberdades de ter- ceiros’. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) tem desenvolvido uma ampla jurisprudência sobre a proteção do acesso a dados de comunicações, afirmando expressamente que os mesmos se encontram abrangidos pela proteção de ‘vida privada e familiar’ ínsita no n.º 1 do artigo 8.º da CEDH. Assim, no caso Malone c. Reino Unido, referiu que o acesso e uso de dados respeitantes a tráfego de comunicações constituem matéria que é abran- gida pelo âmbito de proteção do n.º 1 do artigo 8.º da CEDH (Acórdão de 02/08/1984, queixa n.º 8691/79). Por fim, no contexto da União Europeia, cabe mencionar os artigos 7.º e 8.º da Carta dos Direitos Funda- mentais da União Europeia. Note-se que, antes de a mesma produzir efeitos vinculativos, o Tribunal de Justiça da União Europeia já havia proclamado a existência de um ‘princípio geral de direito comunitário que consagra a proteção contra as intervenções arbitrárias e desproporcionadas do poder público na esfera da atividade privada de uma pessoa singular ou coletiva’ (Acórdão de 22/10/2002, Roquette Frèrres, processo n.º C-94/00). Atualmente, o artigo 7.º da Carta dos Direitos Fundamentais consagra o respeito pela vida privada e familiar, dispondo, inspirado nas demais normas internacionais, que ‘todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações’. Este direito vale, nos termos do artigo 52.º, n.º 3 da Carta, com o mesmo sentido que é conferido ao artigo 8.º da CEDH. Por seu turno, o artigo 8.º da Carta contém uma norma especí- fica relativa à proteção de dados pessoais, proteção essa que recebe, assim, uma consagração expressa e autónoma face ao artigo 7.º. A norma em causa estabelece que ‘todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito’. O Tribunal de Justiça da União referiu que este direito está ‘indissociavelmente relacionado com o direito ao respeito pela vida privada’ (Acórdão de 09/11/2010, Volkerund Markus Schecke, pro- cesso n.º C-92/09 e C-93/09). Por outro lado, esclareceu que a proteção de dados de tráfego das comunicações se
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