TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

701 acórdão n.º 420/17 10.ª É precisamente ao abrigo da Lei 109/2009 que, em 9 de Setembro de 2016, é proferido primeiro despacho do Juiz de Instrução a determinar à operadora que comunique ao processo os dados pretendidos pelo Ministério Público. 11.ª A Diretiva 2006/24, com a instituição de um instrumento jurídico comunitário de imposição de conser- vação de dados, culmina um acidentado e complexo processo em termos de balanceamento entre os polos de liber- dade e segurança e vem geneticamente marcada pela sua dualidade funcional (n. os 5 a 6.5 do corpo da alegação). 12.ª Os questionamentos que antecederam a entrada em vigor da Diretiva 2006/24/CE, mantiveram-se ou intensificaram-se para além dessa data, tendo designadamente originado decisões em matéria de constitucionali- dade por parte dos tribunais de alguns Estados-membros. 13.ª A validação da diretiva, nos termos do Acórdão do TJ, de 8 de abril de 2014, vem a falhar no teste da observância do princípio da proporcionalidade – em um dos seus segmentos, o da estrita necessidade. 14.ª É à luz do princípio da proporcionalidade, no apontado segmento, que, no n.º 65 do Acórdão, se afirma «que a Diretiva 2006/24 não estabelece regras claras e precisas que regulem o alcance da ingerência nos direitos fundamentais consagrados nos artigos 7.º e 8.º da Carta. Impõe-se pois concluir que esta diretiva comporta uma ingerência nestes direitos fundamentais, de grande amplitude e particular gravidade na ordem jurídica da União, sem que essa ingerência seja enquadrada com precisão por disposições que permitam garantir que se limita efetiva- mente ao estritamente necessário» (n. os 7 a 7.3 do corpo da alegação). 15.ª À lei 32/2008, que transpôs a diretiva em causa, se referiu já o Ac. 403/15, no sentido de que «estabelece amplas garantias no que toca ao acesso e conservação dos dados de tráfego e de localização das comunicações para fins de investigação, deteção e repressão de crimes graves por parte das autoridades». 16.ª Considerada a jurisprudência constitucional na matéria (n. os 8.1 a 8.2.2. do corpo da alegação), interessa acentuar que, no caso dos autos, a pretensão do Ministério Público, obviamente não se reportando a dados de conteúdo, não visa a obtenção de dados de tráfego ou de localização. 17.ª Na verdade, os dados de tráfego e localização, com referenciação do endereço do protocolo IP, constavam do processo. Pretendia-se, tão só, com referência a dados já processualmente adquiridos, a obtenção de dados de base. 18.ª Dados prévios à própria comunicação e relativos à conexão à rede, «dados conexos necessários para iden- tificar o assinante ou o utilizador registado» (art. 1.º, n.º 1 da Lei 32/2008) – no quadro da citada Lei 109/2009, «informação diferente dos dados relativos ao tráfego ou ao conteúdo … detida pelo fornecedor dos serviços» (art. 14.º, n.º 4), no caso, «que permita determinar … a identidade, a morada postal … do assinante» [alín. b) do mesmo número]. 19.ª Em suma: visa-se no presente processo a obtenção de dados que «não assumem a dignidade que lhes per- mita conferir a proteção constitucional do sigilo das comunicações». 20.ª Os dados em causa não são, por outro lado, alcançados por um hipotético juízo de inconstitucionalidade, à luz do princípio da proporcionalidade (conjugadamente, arts. 18.º e 34.º, n.º 4 da Constituição), que devesse ter por objeto a questão da indiscriminada amplitude e duração de conservação, bem como do universo de sujeitos abrangido, sistema que, na transposição da diretiva, se manteve nos arts. 4.º e 6.º da Lei 32/2008. 21.ª Ao invés da previsão abstrata e hipoteticamente configurada, os dados concretamente pretendidos visam a identificação de determinado suspeito em processo criminal [art. 1.º, alín. e) do CPP] – e não aleatoriamente referidos a uma qualquer entre «todas as pessoas que utilizam serviços de comunicações eletrónicas, sem que, no entanto, (…) se encontrem, ainda que indiretamente, numa situação suscetível de dar lugar a ações penais» (n.º 48 do Ac. do TJ, de 8 de abril de 2014, cit.). 22.ª Resta observar, em vista de invocada violação do art. 32.º, n.º 8 da Constituição, que os dados visados não virão processualmente consubstanciar, a essa luz (independentemente de sujeição a regime de arguição), prova nula, desde logo não tendo sido obtida com ofensa à integridade pessoal, a sua conservação e ulterior transmissão, no concreto caso dos autos, nos termos do art. 9.º da Lei 32/2008, não poderão ser reconduzidos a situação de abusiva intromissão na comunicação. Termos em que se conclui pela não inconstitucionalidade do art. 6.º, com referência aos n. os 1, 2.ª parte e 2, alín. b) – iii) do art. 4.º e subordinadamente conjugado com o art. 9.º, todos da Lei 32/2008, devendo, em

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