TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

70 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sua sujeição à reserva substancial de lei, enunciada por referência às matérias previstas no artigo 103.º, n.º 2 (incidência, taxa, garantias dos contribuintes), por se tratar, de entre as matérias enunciadas, de um aspeto determinante da incidência do imposto: a definição da matéria coletável.    De todo o modo, a primeira questão de constitucionalidade colocada – saber se, na definição feita pelo legislador da determinação da matéria sujeita ao imposto em causa (por remissão para o VPT do imóvel transacionado) é respeitado o princípio da legalidade em sentido material (ou da tipicidade, como acima entendido) – não se afigura especialmente relevante nos presentes autos.  Desde logo, os dados do presente recurso mostram que ao juízo de desconformidade com o parâmetro constitucional invocado não é conferido desenvolvimento na sentença recorrida nem é feita referência nas alegações de recurso. Tal omissão da argumentação não se mostra, contudo, determinada por qualquer juízo de evidência que pudesse fundar a invocada inconstitucionalidade. É que da consagração de uma «presunção iure et iure » (de acordo com a qualificação feita pelo juiz da causa) em matéria fiscal não decorre inexoravel- mente a violação da «garantia substancial da reserva de lei». A garantia substancial da reserva de lei, entendida no sentido acima exposto, ou seja, enquanto princípio-garantia da tipicidade das normas fiscais, não é, só por si, incompatível com o recurso, feito pelo legislador fiscal, a técnicas de tipificação, não se mostrando desres- peitada quando o legislador prescinde das particularidades do caso individual e remete para aquilo que possa ser considerado um rendimento «típico» auferido pela venda de um bem imóvel – correspondente ao VPT do imóvel – seja por juízo presuntivo (como entendeu o juiz da causa), seja por juízo de normalidade, seja por estimativa. Ao optar pela tipificação legal, entendida como contemplação generalizadora e igualizadora da realidade segundo características coincidentes de grupos e pouco interessada na individualidade cfr. [Ana Paula Dourado, O Princípio da Legalidade Fiscal (…) , cit., p. 339 e também pp. 537 e seguintes e pp. 571 e seguintes; vide os exemplos de casos típicos ou tipos médios escolhidos pela Autora (pese embora na parte em que pondera a tipificação jurisprudencial): correção à matéria tributável em impostos sobre o rendimento, aplicação de métodos indiretos em caso de violação de deveres de cooperação ou dos métodos de atribuição do valor patrimonial a imóveis, ob. cit. , pp. 509-510)], o legislador, de certa forma, procura ainda garantir o constrangimento na aplicação, a previsibilidade dos resultados e a igualdade (cfr. idem ), não se afastando, assim, das exigências formais e materiais do princípio da legalidade fiscal. O desvalor constitucional da norma em causa – a aferir à luz de outros princípios fundantes da Constituição fiscal material – não se retira do princípio invocado.   Depois, a garantia substancial da reserva de lei, enquanto exigência de determinação (ou de determi- nabilidade) das normas que prevêem e regulam os elementos constitutivos do imposto e o seu montante, não se mostra especificamente afetada pela opção normativa em causa nos presentes autos. Como entende Ana Paula Dourado [ O Princípio da Legalidade Fiscal (…) , cit., p. 157], do grau de determinação legislativa exigido pelo artigo 103.º, n.º 2, da CRP pode retirar-se que «quanto às regras de determinação e quantifi- cação da matéria tributável, cabe à lei (parlamentar ou decreto-lei autorizado) definir o regime a aplicar, de tal modo que o intérprete perceba quais as opções em causa e consiga prever (no sentido amplo do termo) o imposto a pagar (valendo aqui o princípio da previsibilidade e calculabilidade)». Assim o Acórdão n.º 127/04: «Se não será sempre indispensável que a norma legal fiscal forneça ao contribuinte a possibilidade de cálculo exacto, sem margem para quaisquer dúvidas ou flutuações, do seu encargo fiscal, é, porém, de exigir que “a norma que constitui a base do dever de imposto seja suficientemente determinada no seu conteúdo, objecto, sentido e extensão de modo que o encargo fiscal seja medível e, em certa medida, previsível e calculável para o cidadão” [cfr. J. Casalta Nabais, O dever fundamental (…) , cit., p. 356, citando esta fórmula do Tribunal Constitucional Federal alemão, embora criticando ainda a sua insuficiência, e salientando que o princípio da determinabilidade deve “ser entendido com alguma moderação e realismo de modo a compatibilizá-lo com o princípio da praticabilidade”].»

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