TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
670 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 67. Ora, conforme é, incontestadamente, aceite pelas doutrina e jurisprudência, a intervenção do Tribunal Constitucional dá-se, nos processos de fiscalização concreta da constitucionalidade, ainda que interpostos ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, por via incidental e de recurso. 68. No caso da douta sentença, agora recorrida, é patente a inutilidade da apreciação do juízo de inconstitu- cionalidade que recaiu sobre as normas constantes dos artigos 2.º, n.º 1, 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 2, do Regulamento da Taxa Municipal de Proteção Civil de Vila Nova de Gaia, aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia de 15/06/2011, na medida em que qualquer decisão que venha a ser proferida pelo Tribunal Constitucional se revela insuscetível de repercussão na decisão impugnada, uma vez que a ratio decidendi desta radica na declaração de ilegalidade transcrita no ponto n.º 6 da presente alegação, determinante, só por si, da anu- lação da liquidação em causa nestes autos, e neles impugnada. 69. Em face desta constatação, deverá ser julgada verificada a inadmissibilidade do presente recurso, dele não devendo o Tribunal Constitucional, em nosso entender, tomar conhecimento. 70. Para a hipótese, meramente académica, de assim se não entender, passamos a analisar a substância da deci- são impugnada, na qual o Mm.º Juiz a quo sustentou a desaplicação das normas contidas nos artigos 2.º, n.º 1, 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 2, do Regulamento da Taxa Municipal de Proteção Civil de Vila Nova de Gaia, com fundamento na sua inconstitucionalidade orgânica, derivada da natureza de imposto da Taxa Municipal de Proteção Civil criada pela Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia, em violação da reserva de lei consagrada na alínea i) , do n.º 1, do artigo 165.º, da Constituição da República Portuguesa. 71. Em primeira linha, começámos por inferir que a referida Taxa Municipal de Proteção Civil criada pelo Município de Vila Nova de Gaia, no cenário da divisão tripartida dos tributos contemplada na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, não é enquadrável no conceito de ‘demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas’, sendo, consequentemente um tributo só possível de qualificar como imposto ou como taxa. 72. Complementarmente, verificámos que a Taxa Municipal de Proteção Civil do Município de Vila Nova de Gaia – configurando-se como compensação de prestações meramente potenciais de que os sujeitos passivos poderão nunca beneficiar, ou como contributo para o funcionamento de entidades municipais cuja atividade incide, essencialmente, sobre a gestão de bens públicos e de interesses maioritariamente insuscetíveis de apropria- ção individual – não constituía contrapartida da concreta prestação de um serviço público providenciado pelo município, de uma qualquer utilização de um bem do domínio público ou da remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares. 73. Ou seja, não se configurando, esta Taxa Municipal de Proteção Civil, como contrapartida equivalente da concreta prestação de um serviço público, da utilização de um bem do domínio público ou da remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, concluímos que não poderia ser classificada como taxa, mas sim como verdadeiro imposto. 74. Densificando tal inferência, apurámos que o tributo criado pelo Município de Vila Nova de Gaia, sob a designação de taxa, constituindo, realmente, uma prestação pecuniária, coativa e unilateral, exigida com o propó- sito de angariação de receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras daquele município, tendo como mera contrapartida o genérico funcionamento de serviços municipais, configurava-se como verdadeiro imposto, tanto mais que não visa compensar um custo ou o valor de quaisquer prestações de que os sujeitos passi- vos sejam causadores ou beneficiários. 75. Completando o argumentário, não se verificando uma relação sinalagmática entre o tributo exigível aos sujeitos passivos identificados nos n. os 1 e 2 do artigo 3.º do Regulamento da Taxa Municipal de Proteção Civil do Município de Vila Nova de Gaia, e qualquer prestação administrativa por eles, efetivamente, provocada ou aproveitada, concluímos que a Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia criou, no caso vertente, um imposto. 76. Tal conclusão remete-nos, inelutavelmente, para o disposto no artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constitui- ção da República Portuguesa, que consagra a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da Repú- blica, no que tange à criação de impostos.
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