TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
668 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL V – Uma taxa municipal “de proteção civil” não deve ser qualificada como contribuição financeira quando agrega o conjunto dos gastos com o serviço municipal de proteção civil, como putativa contrapres- tação de um conjunto indistinto e indistinguível de todas as atividades municipais com atinência à proteção civil. Assim construída, ou pressuposta, não se configura qualquer específica prestação que possa ligar-se “[…] a um conjunto diferenciável de destinatários” ou que permita diferenciar “[…] uma tarefa administrativa imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades que através dessa atividade se pretendem atingir” (Acórdão n.º 539/15). VI – De todo o modo, a qualificação de um tributo municipal como contribuição financeira não salvaguar- daria a sua validade, visto que nenhuma norma contém uma habilitação genérica para a aprovação, pelos municípios, de tributos que não constituam taxas (Acórdão n.º 581/12). VII – Sendo afastada a qualificação de um tributo como contribuição financeira, impõe-se, consequente- mente, a sua integração na figura do imposto ou na figura da taxa, para os efeitos previstos na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. VIII– O artigo 6.º, n.º 1, alínea f ) , do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL) prevê que “[…] as taxas municipais incidem sobre utilidades prestadas aos particulares ou geradas pela atividade dos municípios, designadamente, […] pela prestação de serviços no domínio da prevenção de riscos e da proteção civil”, mas esta previsão não permite afirmar, genericamente, que qualquer taxa municipal de proteção civil resista ao teste da bilateralidade, uma vez que, por um lado, não cabe ao legislador ordinário a palavra definitiva quanto à qualificação de um tributo à luz das normas constitucionais e, por outro lado, o modo genérico como a referida “taxa” se encontra prevista no RGTAL não dispen- sa a análise de cada específico tributo estabelecido invocando essa legitimação, para aferir se nele se encontram efetivamente as características que permitem reconduzi-lo a uma verdadeira taxa. IX – Se as atividades do município na área da proteção civil, a que se refere o tributo, não permitem esta- belecer uma relação – efetiva ou presumida – com específicas pessoas ou grupo que delas sejam causa- dores ou beneficiários, perde-se a conexão característica dos tributos comutativos, num duplo sentido: perde-se do lado dos beneficiários, que não são suscetíveis de delimitação, porquanto a “causa” da atividade e o “benefício” dela decorrente se diluem na generalidade da população; e perde-se do lado da prestação, por não ser individualizável, reconduzindo-se a uma atividade abstrata. X – Neste caso, a determinação dos sujeitos passivos é arbitrária: impor uma taxa “de proteção civil” à generalidade dos proprietários ou das entidades que gerem infraestruturas é tão desprovido de sentido e de justificação como escolher os arrendatários, alguns ou todos os empresários ou qualquer outra categoria de sujeitos, uma vez que nenhum deles tem, à partida, maior ou menor proximidade com a atividade a que se refere a taxa. À falta de elementos que suportem, neste âmbito, uma presunção suficientemente forte de uma relação de troca, não se recorta um conjunto suficientemente definido de prestações concretas da entidade pública e dos sujeitos que a elas dão causa ou delas beneficiam. XI – Se a relação comutativa que deveria estar pressuposta na denominada “taxa” municipal não se encon- tra a partir de qualquer dos seus elementos objetivos, o referido tributo não pode receber a qualifi- cação jurídica de taxa, tratando-se de um imposto, cuja aprovação é da exclusiva responsabilidade da Assembleia da República, nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, o que, inevi- tavelmente, acarreta a sua inconstitucionalidade orgânica.
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