TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
651 acórdão n.º 401/17 aqui também não se mostra especialmente acautelada, a não ser por via da celeridade conferida à decisão de insolvência –, nem tem, por si, qualquer interesse no processo. Assim, mesmo em face da invocação de outros valores constitucionalmente relevantes – como o obje- tivo de celeridade na condução e desfecho dos processos de insolvência – o regime normativo que resulta da remissão feita pelo n.º 4 do artigo 17.º-G do CIRE para o artigo 28.º do mesmo Código (com as necessárias adaptações), ao fazer equivaler o requerimento de insolvência formulado pelo administrador judicial provi- sório à apresentação à insolvência pelo devedor quando este não tenha manifestado a sua anuência quanto à situação de insolvência, a decidir em processo judicial em que não se prevê qualquer forma de participação do devedor em defesa dos seus direitos, representa uma restrição desproporcionada dos direitos do devedor em processo de insolvência de acesso ao direito e a uma tutela judicial efetiva (em especial dos direitos de defesa e de acesso a um processo equitativo, garantidos pelo artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição), dada a situação de indefesa do devedor que deriva da configuração do processo regulado naquelas disposições legais. Assim, conclui-se ser de manter a decisão judicial ora recorrida na parte em que decide não aplicar ao caso o disposto no artigo 17.º-G, n.º 4, do CIRE – quando interpretada no sentido de o parecer do adminis- trador judicial provisório que conclua pela situação de insolvência equivaler, por força do disposto no artigo 28.º – ainda que com as necessárias adaptações –, à apresentação à insolvência por parte do devedor, quando este discorde da sua situação de insolvência» – improcedendo o recurso dela interposto. 16. Por último, tenha-se em consideração o pedido subsidiário do recorrente Ministério Público no sentido do exercício do poder cometido ao Tribunal Constitucional pelo artigo 80.º, n.º 3, da LTC, de modo a interpretar em conformidade com a Constituição o artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas na parte em que manda aplicar o disposto no artigo 28.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas com as necessárias adaptações, já deste segmento normativo se poderia retirar a possibilidade de o «decisor (por força do ditame constitucional contido emergente do artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa) [garantir] ao devedor que não se conforme com o parecer do administrador judicial provisório, e que se oponha à imediata declaração da situação de insolvência, a possibilidade de, querendo, e para além do mais, pronunciar-se sobre o referido parecer/petição inicial, con- testando-o, contrapondo argumentos e indicando prova distinta da aduzida pelo administrador». Isto já que, também segundo o recorrente, «esta amplitude na direcção do processo, concedida pelo legislador ordinário ao decisor judicial, assegura o cumprimento do mandato constitucional e garante o exercício, por parte do requerido/devedor no processo de insolvência, dos seus direitos, constitucionalmente radicados, de acesso aos tribunais, à prova, a um processo orientado para a justiça material, à proibição da indefesa e de exercício do contraditório, todos eles ínsitos nos n. os 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.». Afigura-se, porém, não se mostrar adequada a formulação, in casu , de um juízo interpretativo sobre o artigo 17.º-G, n.º 4, do CIRE (ou sobre o artigo 28.º, do mesmo Código, para o qual aquele remete) que, correspondendo aos ditames constitucionais contidos no artigo 20.º, n. os 1 e 4, pudesse habilitar uma inter- pretação da norma em conformidade com a Constituição. Ora, uma decisão interpretativa a emitir ao abrigo do artigo 80.º, n.º 3, da LTC – justificada nas situações em que, não obstante se conclua pela inconstitucionalidade do sentido normativo relevante para a decisão da situação sub judicie, se verifique que o preceito legal em causa comporta ainda uma outra inter- pretação (conforme à Constituição), em razão do elemento teleológico da norma em causa e que encontre na sua formulação um mínimo de correspondência verbal (sendo, assim, verdadeira interpretação e não a criação de uma norma para o caso) – não se mostra justificada no presente recurso. Na verdade, não se encontra na letra da lei (nem decorre do seu espírito), nem mesmo na parte em que determina que a aplicação do artigo 28.º se faça com as necessárias adaptações, a base suficiente para a formulação de uma interpretação pelo Tribunal Constitucional que vinculasse o aplicador das normas tanto nesta como em futuras decisões. Isto, na medida em que a solução normativa a encontrar – como, aliás, ilustrado pela jurisprudência das instâncias a que este acórdão se referiu –, implicaria a necessidade de
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