TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
640 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL delimitação do objeto do recurso, quer por não caber ao Tribunal Constitucional a sua apreciação em sede de recurso de constitucionalidade, quer sobretudo por não habilitarem (como sucede in casu ) a conclusão de se poder ter por não aplicada a alegada interpretação normativa que ainda habilitaria o prosseguimento dos autos com a audição e defesa do devedor (que o recorrente qualifica como «uma interpretação conforme à Constituição») e não a dimensão normativa que veio a ser efetivamente recusada, por inconstitucionalidade, pelo tribunal recorrido. Assim sendo, o objeto do presente recurso de constitucionalidade, delimitado a partir do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade (aperfeiçoado) no confronto com o teor e razões aduzidas na decisão recorrida, incide sobre a norma do artigo 17.º-G, n.º 4, do CIRE, que dispõe que, caso o admi- nistrador judicial provisório conclua que o devedor se encontra em situação de insolvência, deve requerer a insolvência do devedor, aplicando-se o disposto no artigo 28.º, com as necessárias adaptações – fazendo, assim, equivaler (por força do artigo 28.º, para o qual aquele artigo 17.º-G remete, ainda com as necessárias adaptações) o parecer do administrador judicial provisório que conclua pela situação de insolvência à apre- sentação à insolvência pelo devedor – quando este tenha manifestado a sua discordância relativamente ao parecer do administrador judicial provisório. É essa a dimensão normativa relevante no caso em apreciação, constituindo, assim, o objeto deste recurso – pois dirigido às decisões judiciais que tenham recusado a aplicação de uma norma por razões de inconstitucionalidade, tal como previsto nos artigos 280.º, n.º 1, alínea a) , da Constituição e 70.º, n.º 1, alínea a) , da LTC e limitado à parte da decisão judicial que tenha considerado inconstitucional uma deter- minada norma aplicável à causa por si decidida. B) Do mérito 12. O juízo de inconstitucionalidade formulado nos autos, na sentença judicial ora recorrida, traz por parâmetro o disposto nos n. os 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), consi- derando a sentença recorrida a violação dos direitos do devedor ao contraditório e a um processo de defesa equitativo. Em recurso interposto dessa decisão judicial, alega o Ministério Público que a interpretação normativa questionada nos presentes autos não se revela desconforme com a Constituição da República Portuguesa, nomeadamente com o disposto nos n. os 1 e 4 do seu artigo 20.º, concluindo que não deve a mesma ser julgada inconstitucional ou, em alternativa, e a título subsidiário, defendendo a emissão de um juízo inter- pretativo conforme à Constituição. Isto, nos seguintes termos (cfr. Conclusões das alegações de recurso, supra, I-Relatório, 5.): «13. Complementando e robustecendo esta conclusão com a análise substantiva da compatibilidade constitu- cional da interpretação normativa sob escrutínio e, bem assim, das suas concretas aplicações, diremos ainda, que a interpretação normativa que a Mm.ª Juíza a quo extraiu do mencionado artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insol- vência e da Recuperação de Empresas – designadamente na parte em que manda aplicar o disposto no artigo 28.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – ao salvaguardar que tal aplicação deve ser feita com as necessárias adaptações, impõe ao decisor (por força do ditame constitucional contido emergente do artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa) que garanta ao devedor que não se conforme com o parecer do administrador judicial provisório, e que se oponha à imediata declaração da situação de insolvência, a possibi- lidade de, querendo, e para além do mais, pronunciar-se sobre o referido parecer/petição inicial, contestando-o, contrapondo argumentos e indicando prova distinta da aduzida pelo administrador. 14. Esta amplitude na direcção do processo, concedida pelo legislador ordinário ao decisor judicial, assegura o cumprimento do mandato constitucional e garante o exercício, por parte do requerido/devedor no processo de insolvência, dos seus direitos, constitucionalmente radicados, de acesso aos tribunais, à prova, a um processo
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